Mayor não deixou por menos. Nem por mais. Foi direto ao ponto e, lá, apontou para o estilo de Roberto Alvim, a quem ele chama de "príncipe das sombras".
Leiam aqui a crítica e, logo abaixo, a resposta indignada e feroz de Alvim. Mayor, ao contrário do que acontece aqui em Curitiba, não faz parte daqueles que concordam com tudo o que Alvim diz. E talvez por este motivo, tenha enfurecido Alvim de um jeito que ainda não havíamos visto antes.
Então, para mostrar como se dá a crítica e a resposta à crítica, seguem os "posts" (crítica e comentários que se seguiram).
45 minutos
Finalmente um ator sobrevive a Roberto Alvim (e à Juliana Galdino, certamente). É difícil. Muitos já tentaram, mas todos foram abafados pelo estilo do homem. Não sei se por receio, admiração, respeito, sincronia estética, falta de preparo ou visão reduzida, todos dizem sim, amém, príncipe das sombras.
Resultado: vemos sempre o Roberto Alvim, e nunca os atores das peças do Roberto Alvim. Não estou dizendo que isso seja um demérito, nada disso. É só uma constatação ligeira. O mesmo ocorre com os “dramaturgos” formados pelo Roberto. O estilo do homem é tão marcante que todos os aspirantes parecem habitar o mesmo corpo. Pouco a pouco eles vão se desintoxicando, claro, mas o processo é lento e as seqüelas são irreversíveis. Mas divago.
Caco Ciocler faz 45 minutos (3.5/5), monólogo dirigido por Roberto Alvim. A forma minimal (de uma precisão cênica invejável) de Roberto está toda lá, mas com um acréscimo. Caco Ciocler toma pra si as palavras de Marcelo Pedreira, e a sua enunciação denota que aqui prevalece o estilo do ator e não o do encenador.
Imagino que não tenha sido fácil para o encenador abrir mão do seu “trabalho sueco-enunciativo”, mas sem dúvida todos saíram ganhando. Há um ator aqui. Há um encenador acolá. Há uma dramaturgia que não quer ser agradável ou atraente, e mesmo concessiva, embora seja. Há uma recusa que não é recusa, na verdade, mas artimanha. Uma artimanha narrativa bem articulada e legatária de uma dicção beckettiana e de uma situação kafkiana.
O texto tão logo surgiu já me remeteu ao Bartleby, do Melville, e Um artista da fome, do Kafka. Isso pra ficarmos no mundo das referências mais diretas. Nota-se claramente uma crítica à arte como entretenimento corriqueiro, aliviador do tédio cotidiano e tal, mas isso é o de menos. O que fica do texto é o personagem. Ele é maior do que a coisa toda. É dele que nos lembramos quando ouvimos apenas o barulho dos seus passos ao longe, e depois a porta sendo violentamente fechada.
Marcelo Pedreira escreveu um personagem que você não consegue apagar com borracha escolar. É preciso rasgar a folha. Caco Ciocler deu ao personagem uma dimensão humana nunca antes vista nas montagens do Alvim. O público continua batendo palmas para o palco nu de Roberto Alvim, só que dessa vez ele teve de dividir as palmas com um ator.
Bem, preparem-se para ler a resposta indignada de Alvim. Indignada e desaforada, claro.
vc não faz a menor idéia do que seja direção, seu babaca. vc não faz a menor idéia de que os passos ao longe, a porta que fecha, a maneira como o ator age, a própria idéia de personagem que te agradou, tudo isso é direção… mas lendo teu blog vejo que teus gostos estéticos são o contrário do que eu acredito em arte. então, enfia o teu sarcasmo no rabo e vai estudar, antes de expôr a tua ignorância abissal (acerca de tudo o que constitui o teatro) em público.
E a tréplica de Mayor veio com estilo. Assim:
Peraí que eu tô tirando a coisa do rabo. A coisa, vi agora que tirei do rabo, não é sarcasmo, é só o jeito que eu rio. Você não leu direito. Leia novamente. Em momento algum eu disse que isso (“passos ao longe, a porta que fecha, a maneira como o ator age, a própria idéia de personagem que te agradou”) não fazia parte da direção. Eu afirmei que diferentemente das suas outras montagens, nessa o ator existe para além da enunciação.
Caco Ciocler contribui efetivamente no processo, e isso é visível em sua atuação. Você vai me dizer (não perca tempo) que os atores, todos eles, contribuem decisivamente no processo das suas montagens, e o babaca aqui não vai acreditar em você porque o babaca aqui viu suas peças e viu seus atores, e viu como a coisa se dá. A coisa se dá assim: você compõe seu mundo estético (olha o babaca de ignorância abissal falando de estética em público) e os atores existem como signos. E só. Eu respeito sua pesquisa estética (embora eu seja de uma ignorância abissal). Eu respeito seus atores e o trabalho deles (embora eu seja babaca e fale em público acerca de estética). Eu até acho que pra todos eles o seu processo funcione e seja decisivo pra suas carreiras, no sentido formativo da coisa (mas o quanto antes é bom que eles partam).
Eu só não engulo e nem enfio no rabo o fato de que a sua pesquisa formal elide o aspecto autoral dos atores. Você é o centro, sempre. Em 45 minutos eu te vi como acessório, como parte da coisa e não como a coisa em si. Em suma, você estava mais invisível na cena. Deu pra notar, finalmente, que houve interlocução entre as partes, e que nenhuma era mais determinante do que a outra. Minto: Caco foi determinante. Você foi acessório.
Assim, ó: papai do céu fez pessoas diferentes. E é essa diferença que nos torna seres singulares. Realmente meu mundo estético (será que babacas de ignorância abissal possuem isso?) é muito diferente do seu. No meu mundo estético as pessoas não estão fazendo ARTE. Elas só estão se expressando mesmo. Eu não vou mandar você enfiar nada no rabo porque dói pra burro, ainda há pouco tirei a coisa que você mandou eu enfiar, e acho que você ainda vai precisar muito desse seu rabo aí.
Mais sobre o "bafo", visitem o blog de LUCAS MAYOR, clicando aqui.