sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Uma família desnudada pela palavra

O título da nova montagem da Companhia Brasileira de Teatro traz em si um convite para várias reflexões. Convida e provoca. Estimula e, ao mesmo tempo, se colocada ou dita com certa ironia, pode significar “fique na sua”, ou “não se meta”. A verdade é que “Isso te interessa?” deixou-me com muita vontade de não “ficar na minha” e não deixar de “meter minha colher” na discussão que proponho sobre essa montagem teatral que teve sua estreia, ontem, no Teatro Novelas Curitibanas. Ressalvo, no entanto: o que vou escrever não tem, nem de longe, a pretensão de ser uma crítica teatral. É apenas e tão somente um comentário e uma provocação que faço para ensejar análises mais apuradas sobre o trabalho dirigido por Márcio Abreu e que conta no elenco com Giovana Soar, Nadja Naira, Rodrigo Ferrarini e Ranieri Gonzalez. O texto, do original em francês - Bon, Saint-Cloud -, é de Noele Renaude e foi traduzido por Giovana Soar e Márcio Abreu.
Do que se trata, então, “Isso te interessa?”, do que se trata?
No material de divulgação a peça é anunciada como “uma espécie de saga familiar cotidiana, em que o tempo, na forma e no conteúdo, é um dos principais assuntos”. A peça aborda três (ou seriam quatro) gerações da mesma família. No programa da peça, há o destaque de que são “pais, mães, filhos e cães” que “poderiam fazer parte de qualquer família comum, em qualquer cidade do mundo. Nada de especial acontece. Não há grandes eventos, apenas os acontecimentos chave que determinam as trajetórias prosaicas das vidas dos personagens”.
O programa adianta a sinopse da peça: Um pai que fuma, uma mãe que esquece, um filho que vai embora, uma filha que fica grávida, uma mãe que se separa, os filhos que não “estão nem aí”, um pai que morre, uma filha que morre, uma mãe que fica, uma mãe que decide morrer, um filho que volta, um filho que se lembra, os cachorros que estão por ali, o tempo que passa, as pessoas de quem lembramos, o lugar onde para onde queremos ir e o lugar de onde nunca saímos.
Sim, “Isso te Interessa?” não engana. É mesmo tudo isso. É também, pela tradição de pesquisa de linguagem que a CBT empreende ao longo de sua trajetória no cenário do teatro brasileiro, um passo além. Eu diria muito além. E é exatamente sobre isso, o ir além, na linguagem, na provocação do tal “estranhamento” característico do teatro contemporâneo, no cenário que se mostra simples e eficaz, na iluminação que se abre e se fecha para pontuar a passagem do tempo, e nos singelos efeitos que objetos de decoração da casa (um abajur e uma luminária sobre a mesa da cozinha que depois fica inclinada) iluminam e jogam luz sobre aquela família pra lá de singular e que se desnuda pelo poder da palavra. E da inventividade.
Cenário, iluminação. Palavras, vozes. Figurino. Figurino? Sim. O “figurino” – assinado por Ranieri Gonzalez – é uma grande sacada, é o grande lance, o toque de mestre dessa família que se desnuda diante de uma plateia que fica em suspense, quase sem respirar. O que está faltando? A música, sim, a trilha musical. No começo, assinalando, datando onde começa o trecho da saga daquela família, ouve-se Ranieri Gonzalez cantar Johnny Cash. Novamente fantástico, como fez em VIDA, Ranieri não só assinala o que virá pela frente, na voz, mas no insistente cigarro que nunca se apaga na mão daquele “obstinado” fumante, que diz dar muito duro para, no final, nada de mais importante mostrar, ou lhe trazer recompensa. A escolha da belíssima canção “The Lucky Old Sun (Just Rolls Around Heaven All Day)” (ouça-a aqui) é uma oração, um lamento, um prenúncio das tristezas que estão por vir. Cash teve uma trajetória de belíssimas canções, envolvimento com drogas, prisões, amor arrebatador e uma vida profissional de mais de cinqüenta anos. Ele morreu com 71 anos, em 2003.
Se a canção, lamento e oração de Cash, com Ranieri Gonzalez, dá o tom da trilha sonora que vai permear a vida daquela família singular, o que virá, a partir dali é o que transforma a montagem de “Isso te interessa?” em algo inovador em termos da linguagem dramatúrgica. O trabalho da CBT é sempre de inovação na busca de uma linguagem e do uso da palavra que pode transcender aos limites da enunciação. Esta já se apresenta ainda mais atenta, focada na palavra, nas várias formas de discurso.

A poética dos "rípios"

E o que, aos meus olhos e ouvidos aparecem ainda mais provocativos na forma como é tecida a dramaturgia de “Isso te Interessa?”, tem a ver com o que os italianos denominam de “zeppa” (cunha). Alguns teóricos contemporâneos chamam de “turn ancillaries”, segundo ensina Umberto Eco, “aquelas expressões que, nos romances, seguem as falas do diálogo”.  Para nós, a “zeppa” são os rípios, são aquelas palavras que entram num verso para completar a medida de uma rima. Diz sobre o rípio, de novo, Umberto Eco: “... é uma palavra desajeitada, como a disfunção que define, fonossimbolicamente evoca tosse, espirro, regurgitação e soluço, semanticamente sugere intrusão inábil, remendo evidente”.
A trilha sonora, então, num repetitivo e aparentemente monótono dueto de um violoncelo e contrabaixo acústico, dialoga com os “rípios” que alguns poderão assinalar que sejam apenas as didascálias, ou como queiram, as rubricas que passam a integrar de forma magistral os diálogos e as trocas que são feitas do ator para o personagem, de personagem para personagem, de personagem para ator.

E assim, repetitivos e aparentemente monótonos como o violoncelo e o contrabaixo acústico, as falas dos personagens ganham uma dinâmica cênica sem igual. O que causa estranhamento, na tradição contemporânea do discurso dramatúrgico, vira “zeppa”, “cuneo”, “remplage”, aquelas pequeninas pedras fonéticas que são colocadas no texto para, no dizer do texto, dizer do texto, dizer o que acontece, fazer acontecer no que foi dito e, de novo, repetir o dito, dizer no texto com intermináveis “rípios”, boa parte deles no verbo “dizer”. O pai disse, diz a mãe. Diz a mãe, o pai disse. Um jogo assim com as cunhas fonéticas da palavra “diz” que alavanca a palavra seguinte e embeleza todo o enunciado daquele discurso que pode ter uma aparência estranha, mas é forte, potente, inovadora.
O texto de “Isso te interessa?” trabalha – na tradução de Giovana Soar e de Márcio Abreu – com uma beleza poética que o “rípio”, a “zeppa”, os “turn ancillaries”, não sei se caberia em francês o termo “remplage” ou “remplissage” provocam a cada frase proferida pelos atores, pelos personagens, pelos personagens/atores, naquela troca de falas que não são réplicas, são poesia pura, pois ao invés de serem defeito, por serem remendos, até fragilidades do texto, consertos, deslizes, quedas de tensão, até mesmo as desventuras que por vezes contaminam a pretensa harmonia e essencialidade da estrutura, como ensina sobre o “rípio” o teórico italiano Pareyson, citado por Umberto Eco no seu livro de ensaios “Sobre a Literatura”, os “rípios” da montagem da CBT são essenciais por serem belos. São eles, acima de tudo, que trazem esse ar novo para a estrutura, para a construção e para a beleza da montagem.
Claro, o texto só tem força quando sai da boca dos atores, dos personagens, dos personagens/atores. Leiam isto:
“Você não vai ter brancos como minha mãe, diz a mãe, isso me mata, diz a mãe”.
“Está na hora, ela suspira, de passear claro pros lados de Saint-Cloud, e a mãe fuma, e o cachorro espera, e a mãe diz, veja só nós dois aqui sozinhos por um bom pedaço de tempo, e o tempo passa, e a hora de ir para Saint-Cloud passa e a mãe coça a cabeça do cachorro, e a mãe da mãe entra”.
“Bom mamãe, diz a filha depois ela pára, a mãe para na frente do espelho, eu pareço bem mais jovem que você, observa a mãe, você ta delirando, mamãe, diz a filha, o filho Bloch morreu há quinze anos, a mãe abana o ar, a mãe diz, você sabia que eu sempre detestei Saint-Cloud, a filha sai, ela diz, apenas, eu arruinei o essencial da minha vida”.
Desnudos pela palavra e vestidos de tremendos significados por simples palavras que repetidas, repetidas, repetidas, mostram e revelam o cotidiano singelo de uma família comum, os “pais, mães, filhos e cães”, os personagens de “Isso te interessa?” consagram a montagem nas vozes dos atores, nos corpos de Ranieri Gonzalez, Giovana Soar, Rodrigo Ferrarini e Nadja Naira.
Todos eles, como “rípios” de si próprios e dos personagens que são e em comunhão com os “rípios” da direção precisa, da iluminação necessária, do cenário angulado, oblíquo, num provocante “ponto de fuga” que termina numa pequena parede com um pequeno sofá, fazem um concerto poético muito potente e o “rípio” do violoncelo e contrabaixo acústico, ecoam ainda em mim.

Um adendo, na forma de uma observação crítica

Nenhum espetáculo da Companhia Brasileira de Teatro, sabemos, deixa de atrair a atenção da mídia, da classe teatral e, é obvio, das pessoas que se interessam pelo teatro de qualidade, ou até mesmo, pelo que de “entretenimento” (no sentido de passar o tempo), uma montagem desse grupo provoca.
Há vários dias anunciou-se a estreia de “Isso te interessa?” e a notícia foi publicada por toda a impresa, em jornais, programas oficiais da Fundação Cultural de Curitiba, em blogs e sites especializados em teatro. Anunciou-se a estreia e nas informações publicadas, os ingressos para os interessados deveriam ser retirados de graça, uma hora antes do espetáculo começar, portanto, às 19 horas.
Algumas horas antes, mandei, via Facebook, uma mensagem para o Márcio Abreu, desejando sucesso na estreia. Escrevi, também, a tradicional expressão “Merda!”. Escrevi também em francês: “Merde!”. E na minha mensagem eu escrevi o que se segue e o Márcio Abreu respondeu assim:

Rogério: Merda!
Márcio: Obrigado Rogério! Qdo vc vai?
Rogério: Merde! Vou sim... quero chegar mais cedo para pegar ingresso, hoje mesmo. Será que vai ter?
Márcio: Espero que sim.
Rogério: Um abraço. Até mais. Valeu!

Em nenhum momento pedi para que ele “reservasse” um ingresso para mim. Deixei claro que chegaria mais cedo para pegar ingresso e apenas perguntei se teria ingresso disponível, caso fosse mais cedo. O Márcio respondeu: Espero que sim.

Saí de casa às 18h00. E segui a pé, da praça Osório, ao teatro Novelas Curitibanas, passando pela praça Tiradentes, Catedral, Largo da Ordem, seguindo pela rua Treze de Maio e virando em direção ao teatro. Lá cheguei às 18h32. No mesmo instante chegava uma senhora, que disse ser professora de teatro. Na calçada, no acesso ao estacionamento, que estava com seu portão fechado e nele um cartaz escrito LOTADO. A professora ouviu do porteiro que não havia mais ingressos. Ela lamentou, tentou argumentar sobre a notícia que saíra na mídia, dizendo que “os ingressos deveriam ser retirados a partir das 19h00”. Eu, ao presenciar a cena, confesso, fiquei indignado. Como é que anunciam a retirada dos ingressos a partir das 19h00 e, naquele instante, exatos 18h32 os ingressos já estavam esgotados? O porteiro, com uma lista na mão, me disse: “Pois é, hoje é estreia e só para convidados...” Novamente argumentei: Mas como é que anunciaram para que os ingressos fossem retirados às 19h00? O porteiro, com a lista na mão, disse: “Sempre é assim”. E deu outra detalhe: “O espetáculo é apenas para 33 convidados”.
Novamente, muito constrangido e revoltado, disse: “Mas eles e vocês deviam anunciar que hoje seria apenas para convidados e apenas 33 convidados”.
O porteiro, com a lista na mão, me disse: “Pois é... acontece”.
Neste instante recebi a ligação de uma amiga – a Lorita Rivera. Ela queria saber se eu podia retirar um ingresso para ela, pois sabia que eu ia mais cedo, etc e tal.
Eu disse: “Não tem mais ingresso! Hoje é apenas para convidados. Apenas 33 convidados”.
Completei: “Há umas horas mandei uma mensagem para o Márcio Abreu...” E contei sobre a informação que trocamos.
Foi neste instante, quando eu citei o nome do Márcio Abreu que o porteiro com uma lista na mão, me perguntou: “Mas qual é o seu nome?”. Respondi: “Rogério Viana”. Ele, então, me disse: “Ah, seu nome está aqui. E me mostrou a lista impressa e meu nome, na posição 33, escrito a mão”.
Claro que fiquei agradecido pela gentileza do Márcio Abreu ter anotado meu nome na lista de “convidados”. Mas eu não tinha ido para a frente do Teatro Novelas Curitibanas na condição de “convidado”. Eu fui para lá como interessado em assistir a uma outra estreia naquele teatro, como fiz, recentemente em “Concerto para Rameirinhas” e “Orinoco”. Fui como espectador e cheguei antes, bem mais cedo, para pegar ingresso, como sempre faço.
O porteiro, então, abriu a porta. Fui até a bilheteria e o funcionário me deu o ingresso de número 01. Olhei para o relógio: 19h04.
Qual o motivo que me levou a narrar este acontecimento?
É o que segue.
Sentado na hall do teatro, ouvi um dos seus funcionários comentar com uma jovem de óculos o que estava acontecendo no lado de fora, na entrada do estacionamento. Claro, eu já sabia o que era. Pessoas reclamando por não ter mais ingresso.
Foi aí que ouvi a tal jovem dizer:
“O bafo todo é porque o espetáculo é de graça!”.
Levantei-me, indignado. E disse:
“Você disse o quê?”, ela olhou-me com um ar superior.
Completei:
“Você está equivocada, mocinha. O espetáculo não é de graça, não. O espetáculo está sendo pago pelos nossos impostos. Pelos impostos que pagamos e que permite que o espetáculo de vocês seja financiado pela Fundação Cultural”.
E emendei: “Quem vem para cá não vem porque é de graça. Vem pela qualidade da companhia, dos atores. Vocês deveriam informar sobre a estreia ser apenas para convidados e também que o espetáculo é para apenas 33 pessoas”.
“Mas só hoje, quando colocamos o cenário é que decidimos deixar 33 lugares”, disse a moça que, descobri, depois, tratar-se de Nina Ribas, a produtora executiva da montagem.
E ela completou: “A mudança do figurino (sic) também foi decidida hoje”.
“Mas vocês não utilizam a internet para se comunicar?” perguntei. “Fica muito fácil comunicar qualquer coisa pela internet, pelos blogs, pelos sites, pelas redes sociais”. Mas ela não me levou muito a sério.
Completando a narração do acontecido.
Às 19h17 chegou a segunda convidada, a elegante e linda atriz Viviane Gazotto. Conversamos generalidades. Às 19h21 chegou conhecido autor-diretor-compositor-cantor. Passou direto. O diretor Diego Fortes e uma moça loira chegaram às 19h32. Depois, às 19h43, chegou um casal, ele autor-produtor e ela, atriz-autora. Dois minutos depois, entram dois homens que não identifiquei nomes. Em seguida, às 19h48, entra uma mulher ruiva de cabelos encaracolados. Segue-se a entrada de mais dois homens. Já eram 19h50. Marcelo Munhoz, que é ator e professor de atores, chegou às 19h53. Ele era o décimo segundo convidado a chegar, faltando pouco menos de 10 minutos para o espetáculo começar.
Nos minutos finais, mais 20 pessoas chegaram.
Entramos na sala de espetáculos. Sentei e, ao meu lado, havia uma cadeira desocupada. Antes do espetáculo começar, sentou-se ali a atriz e produtora Cássia Damasceno.
Black-out.
A luz acende em resistência e tem início “Isso te interessa?”.
“...o irmão diz, então nesse caso, os gêmeos se despedem, eu não prendo mais vocês, o pai beija, bom, sua filha, retorno, o irmão fica sozinho, o irmão bebe, o irmão se abaixa, hein? Coça a cabeça do cachorro, nós não temos, diz aí você e eu mais nada a fazer aqui além de ir embora nós também já que, e então o irmão e o cachorro saem”.
Há alguns rípios na minha narrativa. Mas são rípios sem importância, sem poesia. Só com a realidade. Os rípios, poéticos, ficam ecoando na sala, depois que o espetáculo terminou e o público aplaudiu de pé.
“Vocês precisar informar que a estreia é só para convidados. E que essa montagem só tem 33 lugares na plateia”, digo para a tal mocinha, digo, ou melhor, comento com Nina Ribas, a produtora excecutiva que, antes do espetáculo estava mais preocupada em preparar a chopeira para servir para os 30 convidados que lá estavam do que dar ouvidos ao que eu tinha para reclamar. Tive que sair mais cedo. Fazia frio e eu estava voltando a pé. Os rípios ainda estão ecoando em mim.
"...diz aí você e eu mais nada a fazer aqui além de ir embora nós também já que, e então o irmão e o cachorro saem".
O resto é outra história. 

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Tem estreia hoje no Teatro Novelas Curitibanas: Isso te interessa?

Rodrigo, Ranieri, Nadja e Giovana: Isso te interessa?
foto de Elenize Dezgeniski


O espetáculo “Isso te interessa?”, da Companhia Brasileira de Teatro, estreia hoje no Teatro Novelas Curitibanas e permanece em cartaz até 16 de outubro, de quinta a domingo, às 20h, com entrada franca.
A montagem, selecionada por edital do Fundo Municipal da Cultura da Prefeitura de Curitiba, é uma adaptação do texto “Bon, Saint Cloud” da dramaturga francesa Noëlle Renaude, cuja obra é inédita nos palcos do país. Trata-se de um drama permeado pelo humor, em que a vida cotidiana de uma família surge como ponto de partida para reflexões sobre a natureza humana.
Com direção de Marcio Abreu, a encenação traz os atores Giovana Soar, Nadja Naira, Ranieri Gonzalez e Rodrigo Ferrarini. É o mesmo elenco que integrou a premiada montagem “Vida”, com a qual a companhia venceu prêmios como o “Bravo! Bradesco Prime”, de melhor espetáculo do ano em 2010, cinco prêmios Gralha Azul e ainda foi indicada para três categorias do Prêmio Shell de São Paulo.
“A peça aborda quatro gerações da mesma família. É uma espécie de saga familiar cotidiana, em que o tempo, na forma e no conteúdo, é um dos principais assuntos”, conta o diretor Marcio Abreu. Temas como o amor, relações humanas, cotidiano e a forma como as pessoas se relacionam estão em discussão na peça, que também demonstra a preocupação da companhia em criar uma dramaturgia própria, aproximando-se de novos autores e textos contemporâneos. A peça segue a linha de trabalho desenvolvida pela companhia a cada montagem. Uma das características é na atenção especial à potência da palavra, como estímulo à imaginação do espectador e sua participação no evento artístico.
O texto de "Isso te interessa" é uma tradução feita por Márcio Abreu e Giovana Soar da peça "Bon, Saint Cloud", da autora francesa Noelle Renaude. E a indicação da autora é somente "pais, mães, filhos e cães".


Abaixo, trecho de diálogos e narrações dessa família que ganhará vida na noite de hoje no Teatro Novelas Curitibanas:


(...)


Eu estava pensando, diz o pai, que a gente poderia, diz o pai, se interessar agora, ir a Saint-Cloud 

Eu não, diz a filha

Não é época de ir a Saint-Cloud, diz a mãe, mas você pode ir sozinho, diz a mãe, já que

Já que, diz o pai e o pai olha pra filha e a filha olha pro pai e pra mãe, depois a filha decide sair e a filha sai sem dizer uma palavra

Eu não vou a Saint-Cloud sozinho, diz o pai

Por que não, diz a mãe e a mãe se olha no espelho e a mãe ainda se acha bem pra sua idade

Eu ainda estou bem pra minha idade não?

A filha volta a filha diz, o cachorro quer sair

Ah, diz a mãe, a idade nos nossos dias não quer dizer mais nada

Olha ai, diz o pai, ir a Saint-Cloud ia fazer bem pro cachorro



Serviço:

“Isso te interessa?”, com a Companhia Brasileira de Teatro
Direção de Marcio Abreu, com Giovana Soar, Nadja Naira, Ranieri Gonzalez e Rodrigo Ferrarini

Local: Teatro Novelas Curitibanas 
R. Carlos Cavalcanti, 1.222
Data e horário: De 15 de setembro a 16 de outubro de 2011, de quinta-feira a domingo, às 20h.

Entrada franca.


Vejam matéria sobre a estreia da peça publicada no Caderno G, da Gazeta do Povo

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Lançada a quinta edição do Prêmio Luso-Brasileiro de Dramaturgia Antônio José da Silva


A Fundação Nacional de Artes – Funarte, em parceria com o Instituto Camões, de Portugal, promoverá a quinta edição do Prêmio Luso-Brasileiro de Dramaturgia Antônio José da Silva. O anúncio foi feito nesta terça-feira (13/09), na sede do Instituto, em Portugal, pelo presidente da Funarte, Antonio Grassi, e pela presidente do Instituto Camões, Ana Paula Laborinho.
O programa estabelece um prêmio no valor de 15 mil euros para o autor da obra vencedora. O texto escolhido será editado no Brasil e em Portugal. Além de ser um incentivo para o surgimento de novos autores, o Prêmio tem como objetivo impulsionar a escrita dramática em todos os gêneros e reforçar a cooperação entre os dois países.
Inicialmente, serão escolhidos oito textos: quatro do Brasil e quatro de Portugal. A seleção será feita por duas comissões, em cada um dos países. Na etapa seguinte, um júri, formado por três especialistas brasileiros e três especialistas portugueses, vai avaliar os projetos selecionados e determinar o vencedor. Podem concorrer ao Prêmio cidadãos brasileiros ou estrangeiros naturalizados, com um ou mais textos originais.

Edições anteriores e vencedores

A 1ª Edição do Prêmio Luso-Brasileiro de Dramaturgia Antônio José da Silva teve como vencedora a peça A minha mulher, da autoria de José Maria Vieira Mendes (PT). A 2ª Edição teve como vencedor o texto The Cachorro Manco Show, da autoria de Fábio Luís Mendes (BR). A peça vencedora da 3ª Edição foi Jardim Suspenso, de Abel Neves (PT), e a 4.ª Edição teve como vencedor Marco Catalão (BR), com a peça Agro-Negócio.  


Um para Portugal, outro para o Brasil 


Há uma coincidência (ou seria uma regra) na escolha dos premiados nas quatro edições do Prêmio Luso-Brasileiro de Dramaturgia Antônio José da Silva. Um prêmio foi para Portugal, no ano seguinte, foi para o Brasil. Confiram. Nas edições anteriores, o primeiro vencedor foi um texto de autor português. Na segunda edição, ganhou um brasileiro. Na terceira, outro autor de Portugal. E, na última, a quarta edição, ganhou um brasileiro. Se a regra for essa, o quinto, seguindo a mesma lógica, terá como possível vencedor um autor português.
Mais detalhes leiam nos links abaixo:

Site da Funarte, aqui.

ou

Site do Instituto Camões, aqui.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Gustavo Bonin publica crítica sobre disco de Chico Buarque

Gustavo Bonin
O músico e compositor Gustavo Bonin escreveu uma crítica sobre o novo disco do Chico Buarque. É um texto muito rico e importante. Assim, reproduzo aqui. Foi publicado no blog "Amálgama".


O grisalho nas canções de Chico Buarque




Chico, disco novo de Chico Buarque lançado no último mês de julho, foi gravado com velhos amigos e personagens ainda mais antigos. O nome do disco é apelido e síntese, piada e tradição condensada, ensaios finais do fonograma na canção brasileira.
Chico sempre teve a capacidade de dizer muito com muito pouco, discursando internamente com a tradição herdada do Estácio, do Tom e das memórias misturadas. É atualmente um compositor que cria canções quase póstumas, como um Brás Cubas, de Machado de Assis, que morto narra o percurso de sua vida, caracterizando e inventando personagens em contato com o presente momento em que nos conta sua história. O que se assemelha aqui à personagem machadiana é o criador Chico e não a pessoa Francisco Buarque, dito assim para alertar que não se embaralhem as imagens no restante do texto.
O disco possui uma tríade, uma suíte de canções com personagens que reencontram o amor, sentimento bastante desgastado na canção brasileira, e por que “outra história de amor esta hora”? Ora! Porque ela está “tipo afim”. O reencontro ou recomeço é bastante sintomático nas canções “Tipo um Baião” (uma baião-canção, segundo Chico), “Se eu soubesse” (a mais jobiniana) e “Essa pequena” (um blues delicado). Em diferentes momentos e estados temporais, são personagens com certa experiência de vida e certo conhecimento do amor, porém todos se deparam com o inevitável, caindo no mesmo truque, na mesma conversa mole outra vez.
Em “Tipo um Baião”, que rouba da linguagem coloquial contemporânea a expressão “tipo”, se configura o significado do título. A música aceita a incerteza contemporânea da expressão e se inicia como uma canção lenta, vira tipo um repente, e o baião se aproxima aos poucos — por isso ela é parecida com um baião, assim como a personagem está tipo a fim de entrar em um romance assim tipo pra vida inteira, ou algo parecido. A canção foi gravada pelos músicos que o acompanham há mais de uma década: Luiz Cláudio Ramos (violonista e arranjador), João Rebouças (pianista), Jorge Helder (baixista) e o próprio Chico voltando a gravar seu violão, que estava empoeirado e arredio por já ter recebido tanta crítica musical. Este formato de grupo é a base de todo o disco, a pedido do próprio compositor, que quer um disco mais de autor, que é a imagem que ele carrega, a de autor de uma obra e não de intérprete. No caso do baião, a bateria é de Jurim Moreira, que é quem faz a maior parte da percussão do disco, e também o guitarrista Frado, que grava uma guitarra diferente: mais efeitos e distorções.
A canção brasileira em si, tratando-se de forma interna, é basicamente melodia harmonizada. Sua profunda subjetividade de discurso musical está contida nos movimentos internos de sua estrutura, sempre relacionada ao movimento de ligação significativa com a letra, que tateia a realidade. Esse disco abstrai muito as orquestrações do arranjo instrumental, condensa os tratamentos musicais no pequeno grupo de músicos.
No início jobiniano de “Se eu soubesse” Thaís Gullin canta a melodia da introdução, Chico o acompanhamento melódico mais grave, seguindo o baixo, e então entra Paulo Sérgio Santos — e como clarinetista eu poderia falar dele dias seguidos sem conseguir, com a licença do exagero, exprimir a minha admiração. É uma canção bem bossa-choro, bem Jobim-canção, choro-canção. Tem finezas sutis no acompanhamento harmônico, tudo bem delicado. É um dueto de um personagem só, e quando os dois cantam juntos, com as divisões melódicas diferentes, a canção se engrandece, essas diferenças nas divisões é que dão a graça ambígua na identificação de gênero na personagem. Thaís Gullin já havia gravado esta canção no seu segundo disco, chamado ôÔÔôôÔôÔ. Agora, o mais impressionante, marca conhecida do autor, é o quanto de subjetivo ele pode dizer com: “larari, lairiri”.
Mas acontece que eu saí por aí
E aí, larari, lairiri
A personagem passa a canção dizendo que se soubesse não teria ido, não teria saído, mas aí então ele sai. É como diria nosso sonhado phatos futebolístico, na propaganda do café Pelé: Aí já viu né?
blues “Essa Pequena” completa a tríade, os três velhos em tempos diferentes e sendo a mesma pessoa. Nessa canção a personagem se conforma com a sua condição e com tranquilidade diz que ao menos o bluesjá valeu a pena. Conta com a participação do violinista francês Nicola Krassik.
“Rubato” é mais uma parceria encantadora com o baixista Jorge Helder. A primeira parceria — “Bolero Blues”, do disco Carioca (2006), que pra mim se transformou na imagem do Chico contemporâneo (autor que, apesar de conversa póstuma, ainda é bom de papo) — é ainda a grande composição dos dois, com alto teor de qualidade e ousadia. Essa nova canção, uma marchinha, é mais acessível, mesmo com a harmonia e melodia bem cromática e tensa, e é a canção com maior instrumentação, lembrando uma bandinha de coreto. O interessante é ver a personagem se contradizer no interior do discurso, porque ora quer que não roubem sua música, ora é o ladrão que rouba a melodia do songbook, muda e retoca os versos, e publica, e coloca na televisão o seu amor, e o mais rápido possível. Assim é de fato o ambiente interno natural do compositor, em que, de tanta influência, ora rouba (ou não) propositalmente, ora é ele o roubado. É também reflexo de um mercado musical no qual todo mundo é musico e compositor, com meios tecnológicos muito eficientes para gravação e publicação, principalmente na internet. Assim surge esta corrida enlouquecedora de autopromoção. Luiz Tatit possui um artigo ótimo sobre este tema.
Na internet foi feita a promoção deste disco, que podia ser encomendado um mês antes do lançamento pelosite. Então o comprador ganhava uma senha e, durante um mês, recebia aos poucos as canções do disco. Também vinham pequenos vídeos sobre as músicas, os músicos e as gravações, parecido com oDesconstrução, DVD do making off do disco Carioca (sem a cena comovente do Jorge Helder). Em um vídeo que tem Chico e João Bosco mostrando sua parceria “Sinhá”, que irá sem comentada mais tarde, Chico fala sobra as suas aventuras pela internet. A gravação era ao vivo para a internet e acontece um problema, a rede congestiona, e o que foi dito no início do vídeo não apareceu, então Chico precisa repetir, e a piada que faz neste momento (06:55) é o ponto crucial para entender a relação entre ele a e internet. É este autor curioso, um pouco desconfortável com as novidades e comentários dos internautas, que se destaca, mas é um autor que também sabe apreciar alguns de seus recursos, como o “meme”.
“Nina”, que é tipo uma valsa-russa, tradicional na estrutura musical, é vestida de dois personagens que se relacionam pela internet, e a relação não passa disso. É uma canção que foi cedida para a cineasta portuguesa Teresa Villaverde para seu novo longa metragem chamado “Cisne”, estreiado em agosto deste ano, filme que também possui músicas de Caymmi e Caetano Veloso. A Canção tem participação do violoncelista Hugo Pilger e do acordeonista Marcos Nimrichter. A russa que conversa com o personagem reflete a imagem que se criou sobre os contatos sociais pela internet, que na maioria dos casos são efêmeros, de muita imaginação e invenção. Há sutilizas interessantes, quando, embora nova, ela diz já ter chorado feito viúva, mas acabou, esqueceu, e também, quando diz que adora viajar, mas não se atreveria a ir tão longe, ir para um país tão distante. Esses trechos lidam com uma disfunção de grandeza que a rede social provoca. A intensidade é usada com pouca experiência de fato, ou de fato por pouca confiança que a internet disponibiliza.
Assim segue, na mesma linha da imaginação, a canção “Barafunda”, um samba de lembranças com mais um velho personagem, vindo direto dos sambas elegantes do Chico, tipo um “Dura na Queda”, do Carioca. É uma desordem de fatos e fotos velhas, amarelecidas e reinventadas, quase o mesmo personagem do seu Leite derramado, romance de 2009. Essa canção fica entre as mais significativas do disco, a confusão e simultaneidade de imagens dentro da narração são movimentos de descrição muito eficientes, e assim o romancista lhe descreve imagens e ideias que vão vestindo a nudez que dentro existia, formando a imagem do autor. A ideia de juntar simultaneidades significativas dentro de uma narração, como aquele gol na gaveta, aquela bicicleta, diamante negro, verde-rosa de Cartola, imagens das tantas musas ou ainda o quanto a vida é bela (de “Dura na queda”, até na melodia), tem papel fundamental para a caracterização do autor Chico contemporâneo.
“Querido Diário”, que inicia o disco, poderia ser diário de Saramago. Outro velho personagem, caminhando, pensando em ter religião, amar uma mulher sem orifício. A canção é tipo uma moda de viola, acompanhada por um quarteto de cordas fantástico, o quarteto Radamés Gnattali, que vem interpretando obras de compositores brasileiros com finezas admiráveis. “Sinhá” termina o disco, parceria com João Bosco, que também é o violão que grava nesta faixa. É uma afro-canção-milonga, nas palavras de João Bosco, e tanto faz o enquadramento dela em alguma forma. Possui um descaminho interessante entre a primeira e a segunda parte. O escravo que, na primeira, afirma não ter visto sinhá no açude, se transforma, na segunda, no autor, no cantor atormentado, herdeiro da mistura de escravos com sinhás.
De certa forma é um disco emaranhado e intrigante no interior das narrações, mas é bem mais leve que o disco anterior do compositor. Mesmo as memórias são mais claras e as novas situações lhe caem bem. As temáticas navegam no interior dos personagens, revelando ora ou outra alguns movimentos contemporâneos, mas sempre no que eles lhe causam, não sobre eles em si

20MINUTOS.MOV - Convocatória para artistas criadores e performers


A Expressão Gestão e Produção Cultural, em parceria com o Couve-Flor Minicomunidade Artística Mundial, por meio do Edital Corrente Cultural da Fundação Cultural de Curitiba, seleciona artistas para residência e mostra de processo.

Serão selecionadas 03 propostas, de artistas domiciliados na cidade de Curitiba (PR), para desenvolver seus processos de criação. As residências acontecerão de 10 de outubro a 11 de novembro de 2011 no Cafofo Couve-Flor (R. Almirante Gonçalves 1084, Rebouças - Curitiba/PR), e incluem uma mostra de processo aberta ao público.

A mostra acontecerá no dia 11 de novembro de 2011, às 20h, no mesmo local, como parte da programação do projeto 20minutos.mov – Corrente Cultural no Cafofo Couve-Flor. Cada proponente apresentará o seu trabalho no período de aproximadamente 20 minutos. Após as apresentações, será realizada uma conversa entre os residentes, artistas convidados e público.

Cada proposta selecionada terá direito a uma bolsa no valor bruto de R$ 1.000,00.

No período da residência, os selecionados poderão trabalhar no Cafofo Couve-Flor de 02 a 03 vezes por semana, de segunda a sexta-feira, mediante agendamento prévio com a produção.

Para se inscrever

Envie, até o dia 22 de setembro de 2011, para o e-mail 20minutos.mov@gmail.com, em formato PDF:- Uma biografia resumida, telefone e e-mail para contato,

- A(s) proposta(s) a ser(em) desenvolvida(s) (novas criações, trabalhos em processo, ou retomada de trabalhos já existentes), com no máximo duas laudas cada.

Obs.: Cada artista pode enviar mais de uma proposta, contudo apenas uma poderá ser escolhida.

O resultado será divulgado no 30 de setembro de 2011, por e-mail
e no blog expressao-criacaoeproducaocultural.blogspot.com.

CRITÉRIOS DE AVALIAÇãO

- Possibilidade de articulação e diálogo entre as propostas selecionadas.

- Adequação ao espaço, ao tempo e às condições disponíveis.

- Coerência entre a proposta e o histórico e interesses do artista.

- Propostas que tenham abertura para o intercâmbio de ideias e diálogo artístico.

Para outras informações faça contato com

Cândida Monte: candidamonte@gmail.com

Wellington Guitti: produtor.expressao@gmail.com