sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Primeira entrevista de Bortolotto para a TV

No programa Metrópolis Bortolotto fala sobre "incidente" e futuro


Um mês e meio após ter levado três tiros próximo à Praça Roosevelt, Mario Bortolotto deu uma entrevista exclusiva para o “Metrópolis” em sua casa em São Paulo. O programa "Metrópolis" é exibido pela TV Cultura de segunda a sexta-feira às 21h40. Leia aqui mais sobre o caso e visite o blog de Mário Bortolotto.


Matéria da TV Cultura, divulgada hoje pela TV UOL, você pode assistir aqui:


quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Ivan Vilela na TV Cultura - São Paulo

Foto que fiz de show do Ivan Vilela, no Teatro Paiol - Curitiba - 31/10/2007

Um programa imperdível que recomendo.


A TV Cultura (São Paulo) exibe neste sábado (16 de janeiro) às 23h30 o especial Ivan Vilela. O violeiro mostra sua habilidade com as cordas com músicas que marcaram sua carreira. Desde 1996, realiza apresentações no exterior – Espanha, França, Inglaterra, Itália e Portugal –, realizando concertos e conferências em salas de espetáculos e universidades. É diretor e arranjador da Orquestra Filarmônica de Violas. Endorsed das cordas Giannini, é idealizador da ONG Núcleo da Cultura Caipira. Compôs a Ópera Caipira Cheiro de Mato e de Chão a partir do libreto de Jehovah Amaral. É professor da Universidade de São Paulo (USP), além de atuar em diversos festivais de música do País e ministrar seminários sobre Cultura Popular Brasileira, Harmonia Modal, Estética e História da MPB e Viola Caipira. Trabalha como pesquisador há 20 anos, enfocando manifestações da cultura popular em Minas Gerais e interior de São Paulo. Consultor musical do Museu da Pessoa no projeto de criaçã o do portal sobre o Clube da Esquina (2004). Idealizou e coordenou o seminário Caipira: cultura, identidade e mercado, no Instituto e Artes na Unicamp (2003) e o Prêmio Syngenta de Música Instrumental de Viola (2004 e 2005).

Mais sobre o Ivan Vilela, visite:


Ouça músicas do Ivan Vilela, em:





A arte do monólogo - José Sanchis Sinisterra

Sinisterra traça um mapa para entender a Arte do Monólogo

Traduzi "A Arte do Monólogo", texto em espanhol publicado na edição 35-36 da RTC - Revista Teatro CELCIT (Buenos Ayres, Argentina) de autoria do autor e diretor espanhol José Sanchis Sinisterra.
No texto, Sinisterra desenha um mapa sobre o que é o monólogo, classificando-o em três grandes modalidades discursivas: O Locutor interpela a si mesmo; o Locutor interpela a outro personagem; e o Locutor interpela ao público.

Depois de descrever, em detalhes, cada passo da classificação que faz sobre o discurso monológico, o autor espanhol faz uma ressalva brilhante.

Diz ele na parte final do seu texto:

"Esta tentativa de classificação do discurso monologal seria incompleta se não assinalássemos sua incompletude. Todo marco classificatório (taxonômico) é sempre parcial, não definitivo e, provavelmente, reducionista. É importante assinalar que este (o texto dele) não pretende ser outra coisa que um mapa. E o mapa não é território, por mais exaustivo que aspire a ser. A realidade – geográfica e dramatúrgica – é sempre mais rica, complexa, multiforme e perversa. A complexidade e perversão deste mapa, desta classificação, podem, não obstante, ser incrementada pelo leitor, ao tempo de revisar sua memória teatral e inclua nela espécies monologais que não localizem seu lugar nas modalidades e variantes nela recorridas. Também praticando cruzamento e imaginando misturas, combinações e emparelhamentos entre as categorias aqui indicadas. A arte do monólogo tem diante de si, em que pese muitas opiniões contrárias, um brilhante futuro".

Os interessados em ter o texto completo A ARTE DO MONÓLOGO, do José Sanchis Sinisterra, na tradução que fiz, podem solicitar pelo e-mail

rogeriobviana@yahoo.com.br

Atenderei aos pedidos.

Quem preferir ler o texto original em espanhol da Revista Teatro CELCIT, podem fazê-lo no seguinte link:

http://www.celcit.org.ar/publicaciones/rtc_sum.php?cod=29

Textos de Rogério Viana - Um resumo

Textos sobre a mesa de trabalho


Resumo dos textos teatrais de Rogério Viana

(todos registrados na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro)

1 - ARCO, TARCO OU VERVA? Paixão e Alegria de Um Barbeiro Caipira

Musical Caipira

Num lugarejo do interior brasileiro perdido num tempo distante (entre 1950 e 1960) o barbeiro Elias disputa o amor de Mocinha com seu vizinho, o comerciante e agiota Cróvis. Elias tem um amigo, Dorfinho, que é dono do serviço de “arto-falante” do lugarejo. Cróvis conta com a ajuda interesseira de Zurmira, solteirona e fofoqueira. Mocinha, a donzela do lugar tem na amiga Inezinha sua confidente e, esta, é a paixão do Dorfinho.

A história desses personagens é contada pelo narrador na figura de um palhaço caipira – de um circo-caipira-mambembe – o Paiaço Veneno (sou paiaço e sou caipira, tudo isso é o que sô, mais óia pra minha cara, pois burro é que num sô). O musical mostra principais “clássicos” do cancioneiro caipira. Para ajudar Elias a conquistar Mocinha, o paiaço Veneno pede ajuda para o jornalista, poeta, escritor, folclorista e grande incentivador da música e da poesia caipira, o grande Cornélio Pires. Ele se revela “padrinho” do barbeiro Elias, cumpadre do pai do apaixonado barbeiro. Ensinando uns truques, uns versos e umas “modas de viola”, Elias quer conquistar Mocinha com seus versos e sua bela voz. Zurmira faz intriga, arruma uma confusão danada e, no final, com tudo esclarecido, o barbeiro Elias conquista Mocinha, sua grande paixão, com seu talento musical e os versos que, finalmente, consegue por para fora com a ajuda da música caipira e dos seus inesquecíveis e fiéis amigos.

Sete personagens 4 homens e 3 mulheres – Nove músicos e cantores – Música ao vivo

2 – Manhas, Mutretas e o Escambau

Drama

Francisco é um ex-jogador e ex-técnico de futebol que, com cerca de 70 anos, vive isolado e esquecido num confortável e simples apartamento numa grande cidade brasileira. Ele é cuidado por uma fiél empregada (Maria das Dores) e pela única filha (Gardênia), que vive ocupada e sempre com pressa com seus compromissos numa faculdade. Francisco sofre do “Mal de Alzheimer”. Ele tem poucos momentos de lucidez e fica quase todo o tempo sentado numa poltrona e, depois, numa cadeira de rodas. Sem responder nada oral ou fisicamente, no plano real, Francisco ganha vida, movimentos e voz, quando começa ser visitado por lembranças e pessoas do seu passado.

Aparecem seu grande amigo de infância, o menino Zião, sua falecida mãe, sua falecida mulher, o menino depois é seu ex-jogador Tales. Visitam as lembranças do ex-técnico de futebol, um jogador determinado e bem sucedido, um jogador talentoso e que se perde com bebidas, drogas e prostitutas. O pai do menino talentoso, um menino que é abusado sexualmente por um dirigente de futebol. Outro dirigente de futebol que tem um caso com a mulher de um talentoso e promissor artilheiro, além de jornalistas e radialistas, torcedores que aparecem e saem de cena durante os momentos em que a consciência de Francisco quer se fazer presente nas lembranças e nos personagens que foram importantes para ele.

Francisco é lembrado por um amigo para dirigir um time no Paraná e, ao final, faz uma poética declaração de amor pelo futebol e deixa revelado que antigos ídolos sempre acabam esquecidos pelo atual riquíssimo mundo do futebol, dos astros, mas também da grande maioria dos torcedores e dos personagens que sonharam um dia e que vivem apenas a ilusão de um dia ter reconhecimento nos gramados, no futebol, o que ele chama da “dança do diabo”. O texto é uma homenagem a Francisco José Sarno Matarazzo, o Chico Sarno, que foi técnico do Corínthians e outros times brasileiros, e que trabalhou como comentarista de futebol em rádios até metade da década de 80.

Seis personagens – Quatro homens (um deles é um menino) e duas mulheres

3 – Cinco Cafés e Algumas Gotas de Afeto

Drama

Cafeteria. Uma mulher vai ao encontro de um homem que seguiu um roteiro definido por ela para encontrá-la. É um tipo de jogo, um desafio, uma fuga da rotina ou o encontro de duas pessoas que se descobriram tão diferentes e incompatíveis. Quem deve submeter-se aos caprichos do outro. Cafeteria. Uma jovem espera pelo namorado. Eles se encontram. O café é o ponto de encontro e de discórdia. Cafeteria. Um homem fala do seu prazer pelo café e da impossibilidade que tem de experimentá-lo. E é através do café que ele identifica os potenciais e os talentos das pessoas. Cafeteria. Uma mulher e um homem se encontram, se reencontram, descobrem o que tem em comum e o muito que um nada tem a ver com o outro. Cafeteria. São várias, são cinco. E tantas histórias e personagens que aparentam ser o que não são e são o que aparentam não ser.

Quatro personagens – dois homens e duas mulheres (um homem e uma mulher são jovens)

4 – Daysi

Drama

Sobre o universo de Daysi no dia em que ela completa 40 anos

Ao acordar na manhã de seus 40 anos, Daysi, um travesti que foi um inseguro rapaz e uma exuberante mulher, não se reconhece ao passar pelo espelho. Tenta reconhecer quem ela é. Não se reconhece nas figuras nem da mãe, nem do pai. Parece que tem mais a aparência do seu pai. Não parece nada com a mãe. Ele é um travesti que começa a questionar, 22, 23 anos depois de ter decidido viver como mulher, quem é, o que é, o que será sua vida dali para frente. Ao confrontar-se com a realidade, naquela manhã, surgem esparsas lembranças do passado. Flashes nas formas de velhos fantasmas que, ao longo de sua vida, reaparecem, desaparecem de novo. Talvez para cobrar dela uma nova posição ou recobrar-lhe a consciência e o entendimento de quem ela é e de quem ele um dia foi. Será possível? Quais surpresas serão reveladas no dia dos seus 40 anos?

Sete personagens – Três homens e quatro mulheres – O travesti velho é homem, o que quer ser travesti, é homem jovem, o travesti novato é mulher, e os dois travestis são mulheres jovens. O pai/mãe é uma mulher.

5 – Eu Avec Você

Drama

O fuso horário entre Brasil e França apresenta uma diferença de 3 horas. Quando aqui são 11h00, lá já são14h00. Quando estamos iniciando o almoço, lá eles já almoçaram. Quando vamos dormir, eles já estão em sono profundo. Quando acordamos, eles já estão em plenas atividades do seu dia a dia. Estamos sempre atrás dos franceses no que estamos fazendo. São três horas de diferença no fuso horário. Aqui é mais cedo, lá é mais tarde. Aqui tudo para fazer, lá as coisas já foram feitas. Tantas diferenças, três horas apenas. Lá em Paris, aqui, ao sul da América Latina e em outros lugares o tempo não para. Avança. O tempo se mistura, independe do fuso – uma formalidade técnica. Os personagens, dentro ou fora de seus fusos espaciais, temporais, sempre encontram caminhos para uma comunicação que não se dá, muitas vezes, apenas pela palavra. Se comunicar é se aproximar, mesmo distantes, improváveis, impossíveis e utópicos, alguns encontros acontecem mesmo sobre uma folha de papel, ou várias. Apenas lá. Desligue o ventilador e fechem as janelas. Os ventos, ah, os ventos...

Dois personagens – um homem e uma mulher, maduros.

6 – Parent(es)is – Fábula para seis ou mais vozes

Drama

No local onde existiu uma antiga tecelagem hoje é um teatro. Onde era a casa das máquinas, é o palco. Onde é a plateia, antes ficavam as urdideiras, as fiadeiras, as máquinas de tecer. Onde as pessoas circulavam pela fábrica, circulam funcionários, atores, atrizes, diretores, técnicos das várias peças de teatro que naquele espaço são encenadas. O espaço não é povoado por fantasma, mas por vozes e as vozes não são personificadas, as vozes são múltiplas, são diferentes e distintas e se confundem com vozes de operários, de tecelãs, de gente do escritório e com as pessoas do teatro e com os personagens de várias peças. Cada voz, cada personagem em cena, é um pronome pessoal, pronomes singulares, pronomes plurais (Eu, Tu, Ele, Nós, Vós, Eles). Encontros, desencontros, dilemas, intrigas, inveja, raiva, amor, paixão, sexo, tudo se mistura nas tramas dos tecidos que lá foram fabricados e nos tecidos das tramas de novas histórias encenadas. Tramas de afetos e tramas dos fios presentes nos tecidos de cortinas e das coxias.

Seis personagens – pode ser só homens, ou só mulheres. Ou homens e mulheres. Mais homens ou mais mulheres, na distribuição dos papéis.

7 – Das Razões do Nosso Medo

Drama

É um ensaio. Mas é um espetáculo. São histórias de desencontros, de medos, de indecisões. São dois textos que são encenados. São três personagens – um homem, duas mulheres - que trocam seus papéis. Um é homem, depois é mulher, a mulher é outra mulher, depois é a consciência, é quem dirige e orienta a atuação dos outros personagens, que são atores. A consciência sempre pode aparecer em horas inadequadas. Quando chega na hora certa, faz tudo desandar, sair do ritmo, deixar o espaço confuso e o tempo incerto. Depois o homem, que foi mulher, é a consciência do personagem que foi, que será. Aos poucos, deixando aflorar medos e angústias, invejas, loucuras, ciúmes, inseguranças, certezas e o incerto pensar sobre o hoje, o presente e o que virá, os personagens ganham vida e se revelam os próprios atores e o embate diário que eles têm na luta pela sobrevivência e pela busca do papel perfeito, eles que acabam não mais sabendo quem realmente são e, quando se descobrem, através das falas, expõe toda a fragilidade de seres humanos que fazem do instrumento da representação uma vivência de mentiras e inseguranças.

Três personagens – Um homem e duas mulheres.

8 – Homem Ambíguo em Torno do Próprio Umbigo

Tragicomédia

Antes de se enxergar ambíguo, o homem se enxerga espermatozoide, óvulo, cordão umbilical, feto, bebê, gente. Antes de nascer, ele foi gestado, sim, lá em pé, na escada, num sexo ocasional de uma adolescente e de seu namorado surfista que nem nome tinha. Numa rapidinha que bambeou quatro pernas. Depois, dialogando com seu próprio umbigo, enroscado ainda com seu cordão umbilical com a placenta, com o umbigo de sua própria mãe, sua mãe com seu próprio umbigo, trocando de umbigos e de ligações entre si – o homem, seu umbigo, a mulher e seu umbigo – toda a ambiguidade é revelada nas visões que cada um tem daquele limitado espaço importante mas que não pode e nem vai além de simples e simplificadas reflexões atemporais onde o espaço de análise e reflexão não vai além de poucos centímetros ao seu entorno.

Quatro personagens – dois homens e duas mulheres.

9 – Casais (tradução do texto em espanhol Parejas, da autora argentina Susana Lastreto, que escreveu orinalmente em francês, em 1995)

Drama

Noite. Uma adolescente sem sono. No escuro de seu quarto escuta... Os adultos festejam, fazem amor, fazem a guerra. A adolescente se levanta, abre portas, vaga, surpreende intimidades, confissões, dores, segredos. Percorre um labirinto de paixões, descobre o amor, observa o mundo adulto com um olhar curioso, crítica ou divertida, noite a noite, cresce. Ao final da noite, ou de muitas noites, já não será a mesma: terá se convertido em mulher, começará sua própria vida.

O homem e a mulher podem ser considerados como o mesmo casal ou casais diferentes. Por isso pouco importa que às vezes o casal tenha filhos e às vezes, não segundo as cenas. Nem que o tempo seja cronologicamente lógico. Segundo as cenas o casal se separa, ou recém se conhece, ou viveu juntos cem anos.

Os personagens não tem por que ter relações de parentesco entre si; a velha, a dama das rugas não é a avó da adolescente, nem a adolescente a filha do casal. Pode ser às vezes.

É um universo mental. É um mundo noturno, de sonhos e penumbra. Meu desejo é que a cenografia seja a mais simples possível e que todos os textos, inclusive os mais poéticos, sejam ditos com uma grande simplicidade e muito concretamente.

Cinco personagens – Dois homens e três mulheres (uma mulher bem mais velha e uma adolescente)

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O entretenimento morreu

Revista de teatrología, técnicas y reflexión sobre la práctica teatral iberoamericana Editada por el Centro Latinoamericano de Creación e Investigación Teatral, CELCIT SEGUNDA ÉPOCA / AÑO 18 / NÚMERO 35-36 / 2009 / ISSN 1851-023X

Traduzi o texto "O entretenimento morreu" do autor venezuelano Gustavo Ott e que foi publicado em espanhol na REVISTA TEATRO CELCIT, edição 35-36 (Buenos Ayres - Argentina).

Apresento, aqui, parte do texto e quem desejar receber a versão integral (são 10 páginas), poderei encaminhar aos interessados por e-mail. A versão está no formato PDF.

O entretenimento morreu

Sobre Teatro, o Espectador e a Besta

Por Gustavo Ott

Tradução de Rogério Viana

Um aluno pergunta a seu mestre, segundo Zen: A gente sofrerá muito quando se acabar o mundo? E o mestre responde: “A maioria não sofrerá, porque neste momento, quase todos estarão falando de Filosofia”. Então, o aluno, surpreso, indaga: “E o resto?” “O resto passará muito mal – continuou o mestre – porque estarão discutindo sobre Religião e Política”. “E os que não discutem nem falam nada?”, inquiriu finalmente o aluno. Então, o mestre abriu os olhos e com preocupação respondeu: “Esses, temo, sentirão a Dor Maior; sentirão a Grande Dor; a Dor Indescritível”.

Como Badoiu, quero crer que há um período no final do século XX que podemos chamar como de Restauração. Começou ao final da Renovação ou Revolução dos anos 60 e abarcou os 70, 80, e grande parte dos 90 impondo credos em economia, as relações com o poder e os movimentos artísticos, declarando, entre outras coisas, impossíveis as utopias, o fim da história e a glorificação do preceito. No teatro vivenciou a cena como espetáculo; a palavra estava morta e uma imagem, se dizia, valia mais que cem tomos de livros. Na Restauração teve fim a Guerra Fria e Fukuyama assim pode gritar que “a história havia terminado”.

Começou o Entretenimento – antes distração – em direção a uma proposta visual “com alma” e dali ao mundo das sensações e sentimentos pessoais profundos num evidente triunfo dos valores da classe média, que era, julgávamos, a base do nosso público. Um público sugestionado para si mesmo, coração e mercado para o melhor e o pior de nossa obra. Foi a beatificação de Hauser, a ideologia individualista, a ação do protagonista pelo sentido do poeta. Foi nos dito, desde os mestres mais cultos até os improvisados, que escrever era, fundamentalmente, criar personagens e contar histórias. E quase nada mais.

(...)


Interessados em comentar o texto podem fazê-lo através do e-mail

rogeriobviana@yahoo.com.br

Folhas, folhas para contar suas histórias

"Sim, eu passei por ele e me vendo tão ansioso, disse:
Guarde umas folhas desse papel para contar a sua história.
Eu olhei para ele, que sorria. E fiquei sem uma resposta."

Gabriel conta para Martin a experiência que teve ao reencontrar um velho professor de línguas. É da peça "Eu Avec Você".


Gabriel – Vida e morte. Nascimento e desaparecimento. Dia e noite. De um para o outro são poucos segundos, milionésimos de segundos. Se eu estivesse, agora, em Paris, talvez não fosse assaltado por pensamentos assim. Talvez, alguém lá em Paris, se estivesse aqui, caminhando por estas nossas ruas, não se sentiria tão abandonado. Mas eu é que me sinto abandonado aqui, andando em nossas ruas e não é em Paris onde me chegam ideias e sentimentos tão desalentadores. Tem importância o lugar onde a gente está? Ou o que importa é o tempo. O espaço ou as horas? O território ou aquele instante antes do tiro ou do grito de gol? Quando falo com você, meu caro Martin, eu me vejo ainda menino mas olhando o mundo e tudo maior a minha volta, com outros olhos, vendo tudo de uma perspectiva tão mais serena e tranquila. Nada de sentir-me assustado com o que poderia vir. O que eu via grande, eu vejo com sua real dimensão. O que eu via intransponível, eu vejo como uma etapa a mais que venci. O que eu via como inalcançável, bem... cheguei até aqui, não cheguei. Se aqui estou não foi apenas por uma questão de sorte. Ou de azar, pode ser. Quando você divaga assim eu me lembro que certo dia, correndo com algumas folhas de papel sulfite nas mãos, cruzei com o professor Emílio, sim aquele nosso professor que falava tantos idiomas e era de uma doçura impar. Sim, eu passei por ele e me vendo tão ansioso, disse: Guarde umas folhas desse papel para contar a sua história. Eu olhei para ele, que sorria. E fiquei sem uma resposta. Talvez eu tenha sorrido também. Mas lembro-me muito bem que entrei na secretaria da escola e alguém me disse. Não vai precisar das suas folhas. Temos papel suficiente para nosso jornalzinho. Pode guardar o que você trouxe. O que será que isso possa ter de importância em minha vida? Meses depois eu fui estudar no colégio novo e o professor Emílio não foi mais meu professor. Anos depois, muito depois, é que eu fui reencontrá-lo. Conversamos e tomamos uma cerveja numa festa. Eu e ele. Eu já tinha uma filha. Ele mantinha o mesmo sorriso e os mesmos olhos claros e bonitos. Eu olhava para o rosto daquele homem e me sentia igual a ele. Talvez uns 40 ou mais anos de diferença entre nós. Mas ali, na mesa daquele bar eu e ele éramos homens. Não havia na minha frente o professor, o poliglota, mas um homem que falava coisas do nosso dia a dia, da política, da situação econômica do país, daquela festa agropecuária, das escolhas. Sem lições, nem tarefas. Como pessoas normais. Até hoje eu, não sei, mas eu queria perguntar se ele tinha sido feliz como meu professor ou como o professor de todos nós. Eu pago, professor. Eu pago. Afinal, nunca tirei nota menor que 8 com o senhor. Ele deu uma gargalhada. E voltou a colocar a carteira no bolso. Não me lembro de tê-lo abraçado. Mas eu ainda sinto que alguma pergunta eu devia ter feito e que, certamente, alguma resposta ele me daria e que, também, me seria útil futuramente. O que poderia ter perguntado?

As viagens de volta

"Você teme cruzar mesmo o Atlântico? Do leste para o oeste? Fazer uma viagem de volta. Tenho pensado que sempre a gente faz viagens de volta, retornando a alguma lugar que parecia não mais existir para nós."


Está no quarto quadro - Ne me quitte pas - da peça "Eu Avec Você". Uma sensação parisiense. Uma dor, um alento, uma alegria. A fala é da personagem Susana:

Susana – Sua voz, vez ou outra, ganha um tom nostálgico, umas notas agudas de tristeza ficam abafadas, como se houvesse necessidade de se gritar, mas algo a impede. Não, Catharina, não é isso o que você está pensando sobre mim. Não pode ser que, ainda, você não domine mais seu repertório sobre as vozes que sempre consegui representar. Não se fala em tristeza, quando se pensa em esperança. Nem pode-se afirmar, categoricamente, que isso passa ou que não é possível acontecer. Tudo passa e, se passa, aconteceu antes. Ou não. Dá para afirmar ter tido certas experiências sem ter tido certos tipos de dor, de alegria, de medo, de dúvida ou... Ou, não venha com ou... venha com mais. Medo, dúvida... sim, mais desalento, indiferença, esquecimento. Mais nada que virá depois pode se desconectar do que veio antes. Assim, numa cadeia interminável, o que sinto agora tem mesmo uma intrincada ligação com o que estava lá, num cantinho qualquer da minha história. Ou da sua também. Da minha? Minha história ainda está em construção, Catharina. Ainda está. Você sabe. Há muitas páginas ainda para sempre completadas com datas, fatos, pessoas, sentimentos, desejos, desafios. Você teme cruzar mesmo o Atlântico? Do leste para o oeste? Fazer uma viagem de volta. Tenho pensado que sempre a gente faz viagens de volta, retornando a alguma lugar que parecia não mais existir para nós. Fisicamente não nos damos conta de que isso sempre acontece. Catharina, vou lhe contar. Um dia, não me lembro exatamente quando foi, eu passei por uma rua em La Defénse, por onde eu nunca tinha passado. Quando o carro virou na rua Carnot eu me vi transportada para um tempo muito antigo. Não tive forças para controlar aquele sentimento. Era algo que eu vivia, com tanta força, com tanta clareza que pensei estar sonhando. Foram segundos, tenho certeza, os olhos fecharam rapidamente. E todo um sentimento de amor, de alegria e de esperança, de prazer, quanto prazer, quanto prazer! Em seguida, um grito, uma dor insuportável começou a dominar-me. Depois, uma luz, uma paz. Novamente eu abri os olhos e vi um rosto sorrindo para mim. Ouvi um choro de bebê. Várias pessoas estavam ao meu lado. Alguém tossiu, outra pessoa começou a rir timidamente. Depois, uma mulher, de cabelos ruivos com uma linda toca bordada sobre a cabeça, começou a aplaudir, aplaudia... todos também deram risadas... e aplaudiram freneticamente. O choro do bebê diminuiu. Senti, mesmo fechando os olhos novamente, que um suave beijo foi me dado nos lábios. O carro fez a curva e entrou na avenida Gambetta. Acordei com uma alegria tão grande, senti uma paz tão forte. Madame, madame, desculpe-me, mas os policiais indicaram que devia retomar a Gambetta. Vai dar tempo, não se preocupe. Temos tempo suficiente. Olhei e vi que uma ambulância estava parada e uma mulher era retirada de um carro e colocada numa maca. Um policial segurava nos braços, um bebê. Um jovem, muito jovem, aflito, era contido por outro policial. Ele abraçou o policial e o beijou várias vezes no rosto. Foi incrível!

domingo, 10 de janeiro de 2010

Uma luz na penumbra

Página (digital) da Revista BRAVO! Janeiro de 2010

Reproduzo, aqui, texto que postei nos comentários da matéria de Gabriela Mellão sobre o trabalho de Roberto Alvim, publicado na edição de janeiro/2010 da revista BRAVO!:

Tive a felicidade de participar de uma oficina de dramaturgia com o Roberto Alvim aqui em Curitiba durante nove meses em 2009. Não vi nenhum trabalho dele encenado, infelizmente, mas li dois de seus textos. Se há uma preferência por escuridão, penumbra, pouca luz nos trabalhos dirigidos pelo Alvim, ele, no entanto é um "ensolarado professor". Nenhum texto de seus alunos ele lê de olhos fechados ou com a luz apagada. Alvim, que pode parecer dar preferências a textos sombrios como os lidos em sua infância, e os encenados agora em sua fase adulta e criativa, acende todas as luzes sobre os textos dos participantes da oficina de dramaturgia que orienta e não permite que cada texto apresentado seja lido com pré conceitos, ressalvas ou limitações de olhar.

Diz ele: "Aceitem a visão de mundo do autor". Ninguém tem uma nítida visão de mundo se não estiver de olhos, coração e mente bem abertos.

Parabéns pela matéria, Gabriela. Eu li cinco de suas peças e do texto DesolaDor, destaco uma frase (das cartas de Artaud, a Carta de um Desertor) e que, talvez possa contrapor o trabalho do Alvim como diretor, encenador e o trabalho dele como professor, iluminador de novas ideias:

(...) mas vida fede / não posso mais / tratar de teatro,/ nada que remeta arte dramática/ ou cenográfica / não posso mais tratar de mim.

E responde o DUPLO:

Meu camarada acaba de me presentear/ uma decepção terrível / me fez ver a mim mesmo com horror. (...)

Alvim, como Artaud, é assim. Dá luzes para que nós (pretendentes a autores) nos revelemos através da palavra. Da palavra. Não da luz.

Rogério Viana

A matéria da revista BRAVO! e os comentários lá postados, vejam em