sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Carta aberta ao Requião

Abaixo assinado
Carta aberta ao Sr. Roberto Requião

O Movimento de Teatro de Grupo e outras entidades do Paraná se juntam para mandar um documento ao Governador do Estado do Parana, Sr. Roberto Requião.


O texto, resumidamente, é este:


"Nós artistas, produtores e comunidade, certos da importância para toda a sociedade das manifestações artísticas e culturais, vimos através desta, manifestar nossa insatisfação em relação à ausência de políticas públicas levadas a cabo nos últimos seis anos através da Secretaria de Estado da Cultura para os diversos seguimentos artísticos, bem como nossas preocupações quanto às diretrizes para os anos remanescentes desse governo. Como artistas e cidadãos, exigimos que o senhor Roberto Requião, Governador do Estado do Paraná, assuma uma atitude objetiva de promoção e de implementação imediata de políticas públicas de cultura que contemplem a produção, a circulação, a formação e a pesquisa em arte através de leis e editais, bem como garanta a acessibilidade da arte paranaense ao maior número de pessoas. Com esse manifesto esperamos que esse governo entenda que a arte é um bem comum e que é função do Estado dar suporte para que a arte abra espaço na vida dos cidadãos e se faça presente como proposição de mundo. Nos colocamos a disposição para um diálogo aberto e franco com os administradores públicos estaduais."

Para ler o texto completo e assinar, clique http://www.antropofocus.com.br/abaixoassinado.php


Palavras de Brechó

Sueli Araújo, a dona das "Palavras de Brechó"

Num dos encontros com o Roberto Alvim, a Sueli Araújo comentou com três palavras que o assunto utilizava "palavras de brechó". No intervalo do encontro, eu aproximei-me da Sueli Araújo e disse-lhe: Gostei das suas "palavras de brechó". E, então, numa manhã peguei o tema, o mote, a indicação, apropriei-me das três palavras e fiz, em homenagem à autora e diretora de teatro, Sueli Araújo, as minhas "palavras de brechó". Deixo aqui ressalvado e a Sueli disse-me isso, depois que eu lhe enviei a poesia abaixo, que "Palavras de Brechó" é ou será um tema que ela vai abordar num projeto de dramaturgia. Então, para não perder a oportunidade e mostrar o que fiz com a idéia, posto abaixo minhas...

Palavras de Brechó

Para Sueli Araújo

Desafiado pela palavra
o poeta divaga, afia as garras
e nenhuma palavra agarra
agora, neste instante,
sobram idéias, e palavra, nada

Abre um dicionário
nada mais ilusório que
um dicionários aberto
meio que por acaso
sobram palavras, e idéia, nada

Põe uma música para tocar
nada toca seu coração
Liga a televisão
piadas, romances, ilusão
sobram imagens, e palavra, nada

Quer ouvir alguém
trocar umas idéias, conversar
só na sala, o diálogo não vem
fica parado, imóvel, pensa
sobram tempo, e ação, nada

Madrugada, nem sabe
se faz um chá, ou não
chá não tem, mas tem café
falta açúcar e adoçante
sobram copos, xícara, nada

Já é manhã, ontem foi
torturante, procura um bar
um café, bem quente
na manhã de tanto frio
sobram aromas, amor, nada

Caminha sem direção
perde seu rumo, vagueia
olha janelas, vitrines
fachadas, lojas fechadas
sobram títulos, palavra, nada

Um prédio vazio, uma placa
aluga-se para um poeta
o telefone é conhecido
seria de quem imagina
quer ligar, celular, nada

Porta entreaberta, entra
fica alerta, não se conforta
com o que não vê
apenas uma forte emoção
lê, brechó de palavras

para voltar a existir, resistir
a palavra barata, acessível,
seguir, ir em frente, sorrir
bem na sua frente, enfim
a palavra que se compra
a palavra que se presta
palavra que se veste
a palavra que basta
palavra feito roupa
palavra adequada
palavra provada
palavra datada
palavra exata
palavra fútil
palavra sim
palavra útil
palavra
revela
exala
lavra
leva
está
ela

Rogério Viana

Brincando com as Palavras de Brechó da Sueli Araújo

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Cinco Cafés e Algumas Gotas de Afeto

Trecho da peça "Cinco Cafés e Algumas Gotas de Afeto", de Rogério Viana. Texto produzido durante a oficina com Roberto Alvim, do Núcleo de Dramaturgia do SESI Paraná - turma da tarde.

(Ato 2 - cena 2)

(...)

Débora – Então, não é simples mudar...
Rubens – Mudar é o que você queria, você me disse que estava cansada de jogar...
Débora – Jogar por jogar não tem graça nenhuma...
Rubens – Nenhuma graça é não tentar, é ficar na mesma...

Débora – Na mesma conversa sempre, repetição, nada de novo, nada original...
Rubens – Original... bem, eu não sabia ser original... você não me permitia ser original, queria-me seguindo os seus scripts, seus roteiros, suas brincadeiras, seus jogos... Queria-me como personagem nos seus jogos...
Débora – Jogos, aqueles jogos não me agradam mais. Foram agradáveis um pouco só, depois, deixaram de ser... Você sabe...
Rubens – Sabe? Sei?
Débora – Sei...Sabe...
Rubens – Sabe... não consigo mais jogar apenas para ser agradável a alguém...l
Débora – Alguém apareceu em sua vida, então?
Rubens – Então, apareceu... era previsível que aparecesse, não é?
Débora – É... não é?
Rubens – É, mas não é tão fácil assim... Nós nos iludimos com as aparências...
Débora – Aparências sempre enganam, é o que iria dizer? Confirma?
Rubens – Confirma agora a velha estória, aquele mesmo jogo, um jogo de um só adversário, eu mesmo... o adversário real, nunca aparece no cenário. Ele é apenas um provocador, parece desejar mudanças, mas exige tudo ao seu jeito... Aquele mesmo jogo, um jogo de um só adversário... Seria você?
Débora – Seria você o outro adversário, aquele que não vem para entrar em cena e promover o embate, bater e dar a cara para bater, mostrar-se real, vivo?
Rubens – Vivo agora em outra dimensão do sonho original. Não me apetece mais o mesmo e velho sabor...
Débora – Sabor por sabor, o novo não me parece o ideal. Idealizei tanto, tantas fantasias, tantas máscaras, os mesmo disfarces acabaram virando trapos...
Rubens – Trapos devem ser jogados fora. Trapos são as trapaças que no fundo dos armários são o prato predileto das traças... Elas comem e consomem com nossas fantasias, não as simbólicas, mas as reais, aquelas que cobrem nossas inseguranças...
Débora – Inseguranças? O que é inseguro quando não se tem coragem de ousar?
Rubens – Ousar e não usar a ousadia é uma completa covardia...
Débora – Covardia é fugir. Covardia é dizer uma coisa, fazer outra. Fazer outra e não dizer nada, não informar, não comunicar...
Rubens – Comunicar implica no risco do ruído. Aquilo que interrompe, que atrapalha, que dá um sincopado mas não dá ritmo.
Débora – Ritmo é coisa de baterista de jazz. Aqui, nesta mesa, aqui mesmo, escrevi o epitáfio de um antigo e grande amor. Aqui jaz um amor que se foi sem nunca ter sido.
Rubens – Sido, sido... seus verbos são no passado... Nada teria acontecido se não fosse por mim... Se não fosse pelo amor que sempre devotei a você...
Débora – A mim, você diz, agora, que sempre devotou amor a mim? Ou foi seu amor ao jogo, à submissão. Para entrar na dança comigo você teve que aprender a ser conduzido... Eu conduzia, você ia tropeçando, tentando acertar o passo, mas seu ritmo não era igual ao meu. Se eu ia de rock, você queria valsa. Então, dancei...
Rubens – Dancei, sim dancei, conduzido pela sua presunção de perfeita bailarina, a dona do salão... Mas teria que sempre dançar ao sabor dos seus desejos?
Débora – Meus desejos eram promover uma harmonia, numa dança onde alguém pudesse quebrar o ritmo, estabelecer nova coreografia, desafiar-me num pas-de-deux onde não dá para entrar um terceiro parceiro.
Rubens – Parceiro na dança, na sua dança... pois na minha o terceiro que sempre aparecia era um dançarino que tinha que chegar e mostrar a experiência que nunca teve. Você exigia, de mim, o parceiro eventual dos seus jogos, um compromisso com a fantasia, nunca com a realidade.
Débora – Realidade, você vem e fala em realidade, como se ela nos movesse... Realidade é o aqui e o agora, nada de ser o que poderá vir e o que passou, é samba dançado, é valsa que ficou nos salões de Viena, o tango que Piazzolla tocou pela última vez... Aquele Marlon Brando já não usa mais manteiga para penetrar pelo caminho justo e que você sempre julgou inapropriado...
Rubens – Inapropriado? O que é próprio? O que é inapropriado? O que vale? O que lhe serve?
O que você quer mesmo?

(...)

O texto completo está neste link (tem outras peças, outros autores também):


Monólogo de Daysi - texto de Rogério Viana

Um dos monólogos da personagem Daysi, do texto teatral Daysi de Rogério Viana

(Ato 1 - cena 2)

(...)

As fotos, eu Deysi assumida. Assumidamente Daysi. Assumindo-me como mulher. Esquecendo-me que até pouco tempo eu ainda era um Adilson indeciso, inseguro. Uma lagartinha que nunca foi espinhuda e que estava prestes a se desabrochar, a deixar sua casca de Adilson para ser apenas e tão somente a Daysi. Ah, as tais fotos que foram feitas em momentos de tanta alegria, de tanto prazer, de uma cumplicidade que, tenho certeza, eu não poderia viver com nenhuma outra pessoa e nem como outra pessoa. Eu só poderia vivenciar sendo a Daysi. Só como ela. E só com ela é que eu pude, definitivamente, apagar o pouco que o Adilson ainda podia vibrar dentro de mim. Aos poucos, o fogo brando da incerteza e da dúvida que o Adilson me obrigava a sentir eu fui fazendo sumir, apagar. Tudo com muito esforço e dedicação e custando muita maquiagem, muito brilho, muita roupa bonita, muitos hormônios... Ah, os hormônios... Ah, depois, a descoberta do silicone... Como tive que bombar! Ah, estes seios... como foram difíceis para consegui-los bonitos, perfeitos... Muita bomba, muita bomba! Como foram difíceis tê-los tão maravilhosos e desafiando a tudo e a todos. Ah... e o brilho dos meus cabelos, sedosos, sempre sedosos... Cabelos negros, como cabelos de uma indiazinha paraguaia, uma indiazinha guarani... Ah... ele me chamava de indiazinha guarani, uma exótica indiazinha guarani que fazia tantos homens enlouquecerem.
Ah... ele me deixava tão confiante em minha eterna juventude. Eu, uma eterna indiazinha guarani, uma exótica indiazinha guarani. Sabe, até aprendi algumas palavras em guarani... até aprendi a cantar lindas guarânias... (canta um pedaço de Índia) Hoje, já não me lembro mais de nada... O que havia daquela indiazinha, parece que, quando eu acordei, ficaram lá no passado. Não estão a me acompanhar agora, aqui, diante deste espelho que rompeu com uma realidade que, até a madrugada, antes de dormir bêbada, eu ainda acreditava. Aquela indiazinha... parece que sumiu dentro deste espelho. Deixou-me só com as doces lembranças... e, agora, o café que tentei beber e o cigarro que nem consegue ficar mais aceso, tem apenas gosto de coisas sem sentido, de desgosto, sem nenhum sabor de verdade. Mas a verdade, começa a se fazer presente. É essa verdade, no entanto, que me faz olhar no espelho e não aceitá-la.

(...)

O texto completo está no link:


Consultoria de textos dramatúrgicos

Foram definidos os nomes dos participantes e os horários, no dia 25 de agosto de 2009, em que todos receberão a "consultoria de texto dramatúrgico" por parte do Roberto Alvim, com integrantes da turma da tarde.

Na casa do Damaceno

10h00 - Rogério Viana
10h40 - Eliane Karas
11h20 - Nana Rodrigues
12h00 - Cynthia Becker
12h40 - (hora do almoço)

No Teatro José Maria Santos

14h00 - Douglas Daronco
14h40 - Lucas Komechen
15h20 - Cleber Braga
16h00 - Lígia
16h40 - Pagu Leal
17h20 - (horário em aberto)

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Uma Cena - Max Reinert

Exercício coletivo de fragmentação / coesão

Participante : Max Reinert

Texto escrito para o Núcleo de Dramaturgia do SESI Paraná como exercício que tinha a seguinte indicação: "Triálogo. Três personagens descrevem e julgam a um quarto personagem (ausente). Concordâncias e discrepâncias.

Uma Cena

A (entrando): ...um idiota, isso sim é o que ele é!
B (acordando): Hein?
A: Um imbecil pintado de verde...
C: Vai começar a cena... Aliás, já começou.
A (cada vez mais exacerbado): Um idiotinha querendo ser mais do que é... Isso é coisa que se diga? Sim, porque... Oras... As pessoas precisam ter limites... Não se pode ir despejando todo o lixo em cima de outra pessoa e achar que é assim mesmo...
B: Como?
C (para B): Não se meta, você é apenas um coadjuvante.
A (espumando): Ai que vontade de ... (faz sons estranhos)
C: Isso é que é contemporaneidade.
B: De quem você está falando?
A (exausto): Daquele idiota japonês... Aquele imbecil chinês... Aquele anormal chileno... Aquela anta colombiana...
C: É um negro!
A: Nem português ele fala.
B (sem entender): Ahhhh...
C: É mudo.
A: Ficou me perseguindo... Estava de marcação comigo... De um lado para o outro... Pra cima e pra baixo...
B: Hummmm...
C: É aleijado.
A: Uma ova!
B: De quem vocês estão falando, afinal de contas?
A: De um filho da puta!
C: De um sujeito que a partir de agora será denominado "ausente". (pausa)
Ausente de princípios. (pausa) Ausente de determinação. (pausa) Ausente de desejos e vontades e complicações e existência. (pausa) Um sujeito que não vê outra coisa que não seja o umbigo. (pausa) Na verdade, um sujeito que não vê.
(longa pausa) É cego!
B: Vocês estão falando de mim? Eu estava dormindo.
A (gritando): Um filho da puta!
C: Como a maioria de nós.
A (gritando): ...um filho da puta, isso sim é o que ele é!
B (tranquilo): Eu sonhei que havia alguém ausente. Eu sonhei...
C: Um momento lírico... Talvez...
B: ... Sonhei que ele me balançava calmamente em uma rede. E seu rosto era calmo e tranquilo... E ele me dizia palavras doces... E ele me dizia que eu não devia me preocupar com nada... E ele me dizia que eu não era um inútil... E ele era doce... (angustiando-se) Mas ele não tinha rosto... Ele não tinha rosto... Em alguns momentos era somente um borrão, noutros tinha uma cabeça de cavalo... Em outros ainda era como se ele não existisse...
C: É só um pretexto. (longa pausa) Talvez.
A: Não era um sonho... Eu o vi... Ele falou comigo. Tenho certeza. (confuso) Ele me xingou. Era rude. Arrogante. Gritava. Xingava. Eu o vi. Eu acho que o vi. Estava escuro, mas ele me tocou. Isso... Ele me tocou... E disse... (pausa) E disse...
C: É preciso terminar a cena!
A: Não...
B: Tenho sono...
A: Seu imbecil...
C: Como a maioria de nós.
A: Você é como ele... Um idiota... Prepotente...
B: Muito sono... Preciso de silêncio...
C: Já está acabando.
A (enquanto sai, vai aumentando o volume): Um idiotinha querendo ser mais do que é... Isso é coisa que se diga? Sim, porque... Oras... As pessoas precisam ter limites... Não se pode ir despejando todo o lixo em cima de outra pessoa e achar que é assim mesmo...
(longa pausa)
C: Acabou.
(B adormece)


Oficina Regular de Dramaturgia – Núcleo de Dramaturgia SESI-PARANÁ
Roberto Alvim – Curitiba – PR – Aula de 14 de abril de 2009 – Teatro José Maria Santos

O mito de Sisifo, ou que sifo a Copel

Exercício coletivo de fragmentação / coesão

Participante : Rogério Viana


17. Rubrica – O mito de Sisifo em versão contemporânea (ou que sifo a Copel)

(no centro do palco há uma escada e sobre ela uma lâmpada. Um homem entra, olha para a lâmpada, sobe pela escada, acende a lâmpada e desce. O homem sai de cena. O homem entra, olha para a lâmpada, sobe pela escada, apaga a lâmpada e desce. Sai de cena. O homem entra, olha para a lâmpada. Sobe pela escada, acende a lâmpada e desce. Sai de cena. O homem entra, olha para a lâmpada. Sobe pela escada, apaga a lâmpada e desce. Sai de cena. Repete mais algumas vezes o mesmo movimento de subir, acender, descer; de subir, apagar e descer)

(Se a lâmpada não queimar antes, que sifo a Copel)

Oficina Regular de Dramaturgia – Núcleo de Dramaturgia SESI-PARANÁ
Roberto Alvim – Curitiba – PR – Aula de 14 de abril de 2009 – Teatro José Maria Santos

Cu-riitibanóides: homo sapiensis senza culus

Exercício coletivo de fragmentação / coesão

Participante : Rogério Viana


10.Monólogo. Um personagem mostra ao público um objeto artístico de uma cultura “primitiva”, descrevendo-o e interpretando-o.

(personagem segura um quadro onde está colado um rolo de papel higiênico de cor vermelha. Ele tem um ar professoral, com aspecto de um cientista)

Cientista (com roupa de aspecto metálico)

A história da humanidade tem sempre uma surpresa a nos revelar. Em recentes escavaçõescomandadas por humanóides nanorobotizados na província arqueológica dos Cu-riitibanóides, descobriu-se traços de uma antiga civilização que se presume, ainda possuia cu, também conhecido por ânus. Mais que isso, e que ainda aquela população, hoje extinta, limpava-se com pedaços de papel que eram retirados de rolos como este aqui mostrado e que estão fossilizados pela ação do tempo.
Os antigos habitantes da região dos Cu-riitibanóides, agora encoberta por densas camadas de poeira cósmica e restos de uma carbonizada floresta de araucária brasiliensis e outros resíduos de materiais sólidos e micropulverizados, com mais de um milhão de anos, foram a última geração da escala evolutiva antes de atingir a que se convencionou chamar de homo sapiensis senza culus, visto que a espécie humana, nos dois últimos milhões de anos já não registrou a presença do referido cu, que consistia de canal retal, do esfíncter e do anel flexível que existia nas proximidades da parte inferior da coluna espinhal e que por onde eram excretados os dejetos e resíduos da alimentação ancestral.
Este pequeno objeto arqueológico, uma verdadeira relíquia de milhões de anos, tem sido para os cientistas da atualidade, motivo até de intriga. Há uma corrente, dos nanodedacófagos, que diz que o papel higiênico tinha uma única função. Retirar daquele anel rudimentar, chamado como ânus ou comumente denominado cu, o que era definido cientificamente na época como cocô. Alguns, mais eruditos, chamavam-na de merda. Um pequeno segmento, no entanto, não tinha nenhum pudor em afirmar que era mesmo bosta!
Então, este produto, aqui mostrado em estado de fóssil, e que era feito de fibras vegetais – naquele tempo ainda existiam árvores, água e oxigênio – se originava de celulose extraída de árvores, também era feito por resíduos de outros tipos de um produto chamado comumente de papel. O processo desses materiais produzia uma massa e esta massa – esbranquiçada - espremida em enormes rolos metálicos – ainda se utilizava ferro e aço inox no processo industrial da época – e, em seguida, a tal massa era espalhada em imensas correias para secarem. O material, então, era enrolado em pequenas peças como essa e, depois, tinha o seu fim, limpando os ancestrais anéis defecativos chamados de cus.
A evolução do ser humano, a partir do homo sapiensis senza culus, em especial os da região chamada província arqueológica Cu-riitibanóides, também conhecida por província arqueológica Cu-riitibócas, teve origem quando uma parte daquela população cansada de tomar no cu – expressão que significava ser violentada literal ou figurativamente - decidiu opor-se ao regime vigente na época, manifestando-se contrária à estirpe que era comandada por antigos membros de uma casta de privilegiados membros da vigente comunidade política do Paraná – pequena região ao sul do que foi um grande país de nome Brasil - que só sentava a mandioca, o ferro, o cacete, o pau na população e, esta, sentia o quanto ardia seus cus no final de cada mês. Resumindo: de tanto levar no cu, os habitantes daquela região, agora sem registro no mapa ergomasteraquariano, acabaram perdendo a sensibilidade no dito cu e este, sem uso, perdeu a função e, sem função, deixou de ser cu, ânus ou outras denominações comuns à época focalizada em nossas pesquisas mais recentes.
Havia uma expressão popular de então que pode explicar, talvez, com uma razão simplista, surrealista e por não dizer heterotópica, o desaparecimento do cu no corpo da população ancestral da província arqueológica dos Cu-riitibanóides ou Cu-riitibócas. A expressão dizia: Quem tem cu, tem medo. Como a população focalizada em nossas pesquisas se rebelou e perdeu o medo, perdeu, portanto, o cu. A tese ainda suscita discussões acaloradas nas comunidades científicas, locais e extraespaciais que estudam com denotado interesse o fim dos homens-sem-cu.

Oficina Regular de Dramaturgia – Núcleo de Dramaturgia SESI-PARANÁ
Roberto Alvim – Curitiba – PR – Aula de 14 de abril de 2009 – Teatro José Maria Santos

Uma receita de pernil de javali - Monólogo

Exercício coletivo de fragmentação / coesão

Participante : Rogério Viana

3. Monólogo. Enunciação de uma receita de cozinha que vai derivando para a incongruência.

(Cozinheiro com chapéu típico bem alto e vermelho veste avental também vermelho. Na mão direita uma enorme - exagerada - colher de madeira também vermelha. No rosto branco destacam-se as bochechas bem vermelhas)

Cozinheiro

(bem calmo, depois vai se agitando, como se engolisse as palavras)

As carnes exóticas, de caça, possibilitam pratos supimpas, deliciosos. Por serem exóticas, essas carnes merecem tratamento especial, temperos especiais, especiarias exóticas, claro! Nada de temperar como se fosse uma galinha ao molho pardo, ou um frango a passarinho, ou uma pobre sardinha ou uma pomba rolinha. Não podemos nos esquecer que carne exótica não combina com gente comum. O paladar dos comensais deve ser também apurado. Feitas as considerações iniciais vamos aos ingredientes. Atenção aos detalhes, anotem tudo direitinho. A receita é imperdível. Pega-se um pernil de javali selvagem ainda sangrando. Deve ter sido abatido com uma certeira flechada. Se a seta não for certeira a carne pode ficar com sabor incerto. O certo é que de posse da caça o caçador não deve abster-se de terminar o abate com um preciso golpe no coração da fera. Levanta-se a perna traseira direita, aquela que fica no lado contrário da perna esquerda, a que levou o golpe fatal. Uma adaga de corte preciso deve romper a artéria femoral do javali. Depois, força, muita força para romper os ligamentos da perna com o tronco do animal. Retirada a peça, peço que fiquem atentos para a imediata retirada de uma glândula que fica escondida na virilha do bicho. É uma pequena bolsa sebácea, de cor amarela e cheiro insuportável. Lavar imediatamente as mãos e, com certeza, a adaga. Imediatamente retirar a pata fendida do animal. Fazer um corte no pelo do javali a partir do pé fendido, já retirado, e até o local de onde retirou-se aquela bolsinha escrota, escreta, escrita, descrita, dita, cuja ajuda ajudará a produzir uma peça memorável ao paladar mais exigente do comensal mais abastado.
Lave em água corrente. Calcula-se que um javali de porte médio produza um pernil de uns 5 a 7 quilos, no máximo. Para cada quilo de pernil, usa-se 100 gramas de mel, melando referida perna com um punhado de grama fresca amarrada com tomilho, coentro, unguento, rabugento, nojento, salsa, salsaparrilha, nós moscada, dill, o tal endro, mais coentro, dentro, páprica picada, esqueça as da abelha amaldiçoada, adicione, a seguir, sal a gosto, antes pergunte aos comensais quem é hipertenso ou diabético, não é ético, na cozinha, adicionar sal a gosto se o gosto do freguês não permite mais sal ou mais açúcar. Mas não faz mal, sem mel ou sem sal, esta receita não pode terminar mal, afinal, coisa e tal é você optar por uma receita que, convenhamos, para o que se propõe, agradará em muito o principal comensal, mesmo que coma sem sal, salsaparrilha, camomila, melissa, estragão, dill, o tal endro, coentro, unguento, rabugento, desse nojento eu me afugento e me arrebento em uma casquinha crocante que a partir do mel adicionado, desligue o ar condicionado e acenda o fogareiro, prepare o braseiro, coloque nele o pernil inteiro e deixe fritar, digo cozinhar, cozer, manter em banho maria, se ela não estiver disposta, alegando dor de cabeça, enxaqueca, período fértil, menstruação, use da imaginação, agite bem seu instrumento, com uma mão, depois a outra, deixe escorrer o líquido denso, esbranquiçado, o leitinho de duas latas de leite condensado, coloque tudo numa panela bem pequena, assim que começar a ferver, adicione cinco enormes colheres de chocolate em pó, não do tipo Nescau que pode ser melhor, mas faz mal, junte uma colher de manteiga, margarina não vale, nem sem sal, salsaparrilha que é bom para dor de barriga. Esparrame o resultado do cozimento numa peça, na sua mesa de mármore, não faz mal, or more, que de mal a gente não morre, mas seu brigadeiro pode ser enrolado e você, deve adicionar sobre ele pistache picado, pimenta malagueta, aniz estrelado, endro, o dito dill e, assim se prepara a grande ceia da pátria varonil, encoberta por um céu todo anil, as cores do Brasil, meu Brasil brasileiro, meu mulato inzoneiro, e tudo aqui vira um puteiro onde todos nós somos nossa própria sobremesa, onde nela sobrevieram os sobreviventes, os pobres viventes que ainda acreditam numa receita milagrosa para tornar a todos nós super heróis de nós mesmos ou os pobres habitantes que somente podem comer os restos da ceia dos cardeais, não aqueles de épocas ancestrais, mas de tempos atuais que lá de longe, em Brasília, Londres, Milão, Tókio, Moscou, Paris, Dacar, Shaolin, Pequin, Beijin, adicione um pouco de pequi, pedaços de caqui e é por aqui que termino e me despeço, já enfadonho. Tenham uma boa ceia, comam à vontade, saúde e, depois, não se esqueçam de arrotar que faz bem. Muito bem! Se alguém cair de quatro, cuidado. O javali ficou manco e não sabe andar de muleta ou de bengala!

(Todos em cena arrotam, felizes e satisfeitos. Vomitar não é preciso, arrotar, sim)

Oficina Regular de Dramaturgia – Núcleo de Dramaturgia SESI-PARANÁ
Roberto Alvim – Curitiba – PR – Aula de 14 de abril de 2009 – Teatro José Maria Santos


segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Uma cena de Cynthia Becker

Brigite na cena criada por Cynthia Becker

Vejam esta cena de Cynthia Becker no site Teatro Para Alguém.