Nossa Aposta - Marcos Damaceno
O diretor e dramaturgo se destaca em Curitiba com peça que ironiza nomes caros à cidade, como o ator Luís Melo
Por Cecilia Arbolave
A cidade de onde o ator Luís Melo e o encenador Felipe Hirsch partiram para ganhar relevância nos palcos brasileiros está gerando um novo talento. O diretor e dramaturgo Marcos Damaceno ainda colhe os frutos da ótima repercussão que obteve em março durante o Festival de Curitiba, uma das mais importantes mostras teatrais do país. Paulista de 28 anos, ele mora na capital paranaense desde a infância. Com o monólogo Árvores Abatidas ou Para Luís Melo, virou sucesso de crítica: a peça se destacou entre as 290 montagens que participaram do Fringe, o evento paralelo ao festival. Por conta do desempenho exemplar, Damaceno — que coordena o Núcleo de Dramaturgia Sesi Paraná, voltado para a formação de novos autores — vai trazer o espetáculo a São Paulo em novembro.
Não errará quem disser que suas produções devem ser vistas com os ouvidos. Na contramão do teatro tradicional, que privilegia a ação e o enredo, o diretor preocupa-se em ressaltar a palavra. Burila intensamente o texto na tentativa de encontrar uma linguagem mais adequada à oralidade e prioriza, acima de tudo, o ritmo das frases. É pela musicalidade dos diálogos que almeja fisgar a plateia. Por isso, prefere se apresentar em lugares pequenos, quase sem elementos cênicos, para que as falas do elenco estabeleçam uma relação íntima com os espectadores.
Geralmente, Damaceno exibe suas peças nos fundos da casa onde mora, em São Francisco, bairro boêmio de Curitiba. O sobrado de 70 m2 recebe entre 40 e 60 pessoas por sessão. "Para mim, a escolha do espaço é fundamental, já que o público tem de ficar na mesma pulsação dos atores", afirma. Essa comunhão com a plateia revela-se especialmente forte em Árvores Abatidas ou Para Luís Melo. Na mais recente criação do dramaturgo, baseada em livro do escritor austríaco de origem holandesa Thomas Bernhard (leia resenha sobre uma obra do autor na página 76), o elenco atua praticamente ao lado dos espectadores. A atriz Rosana Stavis — veterana com 20 anos de palco — protagoniza o monólogo. Durante um jantar com artistas para homenagear um ator famoso, sua personagem conclui estar rodeada de gente medíocre e, desapontada, dá início a uma penosa reflexão.
Oscilando entre o sombrio e o sarcástico, o texto desfere sutis estocadas em profissionais que se lançaram nacionalmente a partir de Curitiba. A protagonista imita vários dos presentes na reunião — entre eles, uma escritora que se julga sucessora de Virginia Woolf e que é chamada de Nena. Trata-se de uma alusão à diretora e produtora Nena Inoue. A atriz também arremeda o ator homenageado, um célebre intérprete do teatro nacional "que até faz telenovela", e critica sua soberba. Igualmente ferina, zomba de Felipe Hirsch. Embora o nome de Luís Melo só apareça no título da peça, fica claro que o ator da Globo, egresso da trupe de Antunes Filho, é o convidado de honra daquele jantar.
Um ataque pueril contra os que alcançaram o sucesso? "De jeito nenhum. Não desejo provocar por provocar", explica Damaceno. "Pretendo apenas refletir sobre a nossa condição de artistas e o ambiente cultural de Curitiba. Não dá para levar a sério quem não sabe rir de si mesmo." Ao menos em público, Luís Melo demonstra ter absorvido bem as provocações. Ele diz admirar a trajetória do diretor. "Seu diferencial é justamente a persistência em procurar uma nova estética. Eu acredito no Damaceno."
Cecilia Arbolave é jornalista.
Sobre Damaceno na revista BRAVO! veja o link:
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