"Aqui existiu mesmo uma tecelagem. Funcionou durante anos.
Empregou muita gente. Pessoas reais. Vivas. Gente de carne e osso. Personagens e citações aqui, nada aparece por mera coincidência. Por se tratar de obra de ficção, no entanto, nada aqui pode-se atribuir como invenção, obra do acaso, coincidência."
No meu texto "Parent(es)is - Fábula para seis ou mais vozes", seis ou mais vozes falam sobre e nos encontros que acontecem ou aconteceram numa antiga fábrica de tecidos e onde, hoje, as vozes são de outras pessoas, de atores, diretores, cenógrafos, iluminadores, gente que vive não mais na fabricação de tecidos mas na tessitura de papéis, de olhares. Os personagens são os pronomes pessoais, do singular e do plural. No segundo ato - são quatro atos ou quatro quadros - "Prólogo na Casa de Máquinas", "Eu" diz no seu monólogo o que, aparentemente, devia ter sido apresentado no começo da peça:
Eu – Pra começo de conversa, quero alertar, deixar bem claro, que nada do que está sendo tratado aqui está isento de alguma realidade. Aqui existiu mesmo uma tecelagem. Funcionou durante anos. Empregou muita gente. Pessoas reais. Vivas. Gente de carne e osso. Personagens e citações aqui, nada aparece por mera coincidência. Por se tratar de obra de ficção, no entanto, nada aqui pode-se atribuir como invenção, obra do acaso, coincidência. Algumas coisas são como são. Foram como foram. Acontecidas ou não, não adianta querer esconder o óbvio. Não estou, também, usando o recurso do “control C” e o “control V”. Ninguém me mostrou nada por escrito. Sim, talvez eu use isso, mas é de memória. Não, não a minha, claro! Não é físico. Não fui lá nos meus arquivos e copiei isto ou aquilo. Se estou citando, também, é de memória. Minha memória é fraca, no entanto. Vez ou outra, cito errado, confundo. Minha mente anda confusa nos últimos tempos. Talvez pela idade avançada, sei lá. Algumas vozes, vez ou outra dizem alguma coisa. Como? O que você está dizendo? Quem? Ah, dela eu me lembro. Sei, sim. Pode ser uma pré-menopausa. Ou seria andropausa? Claro, depende de quem vai ser “eu”. Não conte tudo de uma só vez. Conte aos poucos. Se for mulher, é menopausa mesmo. Mas se ela for jovem. Bem, pode ser, então que seja desleixo. O que não falta é mulher desleixada, que não se cuida. Mas tem homem que gosta de mulher porca. Eu não gostava dela não. Você foi quem tocou no nome dela, lembrando dela. Pois uma mulher jovem não pode ter menopausa. Nem menos pausa para fazer o que lhe dê na telha. Se quer transar, ela vai transar e ponto. Falando em ponto, eu estou tentando ver se alguém consegue localizar onde fica aquele tal pontinho que um tal Grafenberg inventou. Ou diz que encontrou, que existe mesmo dentro de nós, na parte mediana do nosso canal vaginal. Tem certas coisas que são difíceis de serem constatadas. Nem quando o neguinho é pego em flagrante ele admite. Nega, nega, nega! O óbvio, por exemplo. É óbvio que é difícil constatar o óbvio. Esfregam nas nossas caras e não enxergamos. E continuando negando. Foi por este motivo que resolvi dar um passo atrás e, mesmo depois de ter começado, lá antes, no começo, na primeira fala, retomar e falar o que, agora, passa a ser o prólogo. Mas tinha cada polaquinha atrevida aqui. Tinha também umas que não dava nem com ameaça de demissão. Uma que vivia dizendo não. Ah, nem te conto. Esperta que nem ela só! Logo, portanto e para os devidos fins, deixo claro que meu “eu” seja, então, de um homem. Pode ser um homem mais velho, de meia idade, ou mais jovem. Tudo vai depender de você. Eu topo, topo sim. Venha. Vocês escolhem o perfil ideal para o “prólogo” ora apresentado. Aqui no meio da casa de máquinas. Há luz suficiente? Vai ficar me espiando, não é? Ah, o prólogo tem que dizer, colocar, o que se pretende com essa baboseira toda. O prólogo, aqui, tem o real objetivo de deixar tudo bem explicado. Nada aqui é verdadeiro ou é falso. E nada do que possa parecer falso, é falso mesmo. Sendo assim, se só direi mentiras, nem tudo é mentira, nem tudo é verdade. Se só digo mentiras, bem, brincar vale a pena. E se é brincadeira o que faço, melhor vocês levarem a sério ou, se se permitirem ir além do que aqui aparenta ser, mas não é, melhor que tratem de prestar atenção. Eu topei, de cara. Foi bom demais. Ela, não, vivia fazendo cu doce. É o que recomenda a lição que li. Estava escrito, bem impresso. Confesso não ter entendido direito, mas como sempre levo a sério o que me dizem com aspecto de seriedade, sério serei e não impeçam que eu trate aqui, tudo, tudo mesmo, com a maior seriedade possível, mesmo que entendam não ser possível isso, assim, acontecer. Ele dizia, como tu: Não vou aceitar, nunca mais, que você fale comigo pelos outros. Nada de ficar mandando recadinhos, mensagens pelo MSN. E-mail seu, nunca mais abri. Vão direto para a lixeira. Se tem que dizer algo, diga tudo. E não diga nada que comece com “mas...” ou com “talvez...”, nem com “quem sabe...”. Se vai dizer não, diga não. Se vai dizer, sim, é sim. E acabou. Onde é mesmo que eu estava?
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