sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Se hoje eu sobrevivo é porque sou teimoso

"Ou foi depois, muito depois que você se olhava
no espelho e via refletida aquela mesma
imagem de homem derrotado?"


Num tipo de desabafo, o personagem Gabriel diz em "Eu Avec Você":

Gabriel – Tenho sempre batido na mesma tecla. Repetido os mesmos erros. Repetidas vezes eu me vejo repetindo as mesmas palavras. As mesmas frases já repetidas tantas vezes antes. Você não fez sempre assim, fez, Martin? Também insistia naquilo que você tinha absoluta certeza? Insistia no que, lá no fundo, via que era a mais absoluta perda de tempo? Tinha consciência disso, Martin? Ou foi depois, muito depois que você se olhava no espelho e via refletida aquela mesma imagem de homem derrotado? Agora, quando eu digo isto para você é que eu me dou conta de como tivemos uma aventura pela vida muito parecida. Diria, quase sem nenhum erro, que somos tão parecidos que deveríamos ser irmãos. Não desses que nascem do mesmo pai filho da puta e da mesma mãe que todos acreditam que seja uma puta. Não falo desses. Falo de irmãos que nasceram em épocas diferentes, de pais diferentes, mães diferentes, mas que são irmãos pelo simples fato de comungarem de ideias e ideais com a mesma intensidade e força. Sabe, irmãos de fé, sobretudo. Camaradas. Depois você me diz se estou com uma certa razão ao reclamar que tratam a mim e aos meus sonhos como sem a mínima importância. Não posso aceitar que meu sonho não tenha um valor. Eu sobrevivo dos meus sonhos, não foi isso que tenho falado? Não sobrevivemos por teimosia, nem por termos dinheiro, ou boa saúde. Ou até, por termos pessoas que nos amam. Se hoje eu sobrevivo é porque sou teimoso. Por continuar acreditando que um dia, não sei quando, mas um dia, com toda a certeza eu serei reconhecido em alguma coisa que eu venha a fazer. Ah, não sei não. Toda essa fé eu não tenho! Não dá para ser assim tão dedicado a nossos sonhos, caro amigo. Não dá. Veja bem, veja bem. Não o estou recriminando, longe de mim fazer isso. Você é meu camarada, claro que é. Mas... Só esperar que os sonhos nos tragam um tipo de iluminação é meio ir longe demais, você não acha? Se a gente fica só sonhando já indica que só dormimos. Ninguém sonha acordado. Acordado a gente cria, inventa. Sonho, sonho mesmo, só tenho quando consigo dormir. Além do mais, o médico me disse que o tal Rivotril pode me deixar dependente. É tarja preta, potente. Aos poucos eu tenho dormido melhor, mais horas. E quando durmo profundamente eu sonho. Sonhar me faz viver de um jeito diferente, melhor. Sei lá, mas nunca sonhei com números. Ah, só com as contas atrasadas. Muitas. Quanto? É muito, pode acreditar.

(NOTA - As fotos que utilizo ou são colagens que faço ou fotos do meu arquivo, fotos que tenho feito ao longo do tempo. Rogério Viana)

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